terça-feira, 28 de dezembro de 2010

CASA DO CONCELHO DE RESENDE EM SINTRA ORGANIZOU FESTA DE NATAL*

Almoço de Natal
Como já vem sendo hábito, a Casa do Concelho de Resende em Sintra levou a efeito, no passado dia 12 de Dezembro, na sede do Sporting Clube de Lourel, uma festa de Natal, de cujo programa fez parte um almoço e uma tarde de convívio. Durante toda a manhã, voluntários deram o seu melhor na cozinha para que do almoço saísse um manjar. Enquanto na cozinha se trabalhava afanosamente, uma mesa ao lado ia-se embelezando de aperitivos e sobretudo de sobremesas que iam chegando, fruto da arte e colaboração de várias famílias.
A partir das 12h começaram a aparecer os primeiros convivas. Até ao início da refeição, pelas 13h, quem chegava ia pondo a conversa em dia. Os vínculos a Resende foram ditando as palavras, dichotes e silêncios, sendo a razão do à vontade entre todos. Foi lá, na mesma terra comum, que se moldaram personalidades, se forjaram os primeiros sonhos, se construiu a paisagem indelével das geografias pessoais e se desenrolaram os acontecimentos que se converteram em referências da memória e em escudos contra a saudade. Para quem vive longe, Resende é um conjunto de lugares e pessoas que povoam recordações, tendo o condão de desencadear, mais que um sentimento de melancolia, uma força tranquilizadora que, não importando onde se viva, convoca para convívios entre conterrâneos como este, ou para o refúgio originário onde se nasceu e cresceu, para onde se pode retornar ou regressar definitivamente.
Marcaram presença neste almoço, servido a preceito por uma equipa com adereços do Pai Natal, 167 pessoas. O Presidente da Direcção, Joaquim Pinto, desejou a todos Boas Festas de Natal, fazendo simpaticamente questão de sublinhar a presença do repórter do “Jornal de Resende” nos últimos eventos da Casa do Concelho de Resende, tendo lançado o desafio aos presentes para que assinassem e lessem este jornal, pois, além das notícias, “tem a vantagem de não sujar os dedos”.

Tarde de convívio
O programa da tarde esteve muito voltado para os mais novos, como convida esta quadra natalícia. Por volta das 16h, teve início uma representação teatral por um grupo de dez jovens, que levou ao palco a peça “Noddy salva o Natal”, escrita pela Educadora Carolina Pinto Dias. Durante cerca de um mês, “o encenador” Joaquim Botelho deu vida e ajudou a interiorizar personagens tão divertidos como o Noddy, o Pai Natal, o Sonso, o Orelhas ou o Mafarrico, que prenderam a atenção e fizeram soltar gargalhadas à numerosa assistência. “Era uma vez no país dos brinquedos…” foi o mote inicial que teve o condão de calar toda a gente.
Seguiu-se a actuação do Grupo Coral da Casa do Concelho de Resende, que brindou a assistência com várias canções alusivas ao Natal. Refira-se que a sua próxima actuação acontecerá no dia de Reis, nos espaços da Câmara Municipal de Sintra, onde mais uma vez serão os arautos de canções assentes num reportório com origem, quase exclusivamente, no concelho de Resende. Na sequência desta actuação, foi dada a oportunidade para alguns dos mais novos mostrarem os seus talentos musicais.
Quando menos se esperava, um grupo de palhaços entrou em cena, pondo as crianças de olhos em bico, e que serviu para preparar a chegada da personagem mais desejada, ou seja, o Pai Natal. Quando este apareceu, com o sonoro “Ho!Ho!Ho!...”, foi o encantamento para as 27 crianças presentes, que seriam contempladas com brinquedos, retirados de um grande saco vermelho. Para marcar ainda mais a diferença desta tarde, dedicada sobretudo às crianças, as mesmas, antes de irem para suas casas experimentar os brinquedos recebidos, foram obsequiadas com um lanche, à base de bolos e pastéis, que já tinham feito crescer muita água na boca.
Refira-se que esta tarde de animação, que mereceu o aplauso de todos, foi fruto exclusivo do empenhamento e da criatividade de elementos ligados à Casa de Resende, o que deve ser devidamente realçado.
*Apontamento da autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, número de Dezembro de 2010

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

HISTÓRIAS DE UMA VIDA… EM BARRÔ: Chamo-me Henriqueta de Jesus e nasci em Vales, Barrô, há 76 anos*

Vida dura
Venho das minhas territas, onde continuo a trabalhar. Semeio batatas e feijões, planto cebolas, alfaces, tomates e couves; apanho fruta, vindimo e faço a poda. Parar é morrer. Para cismar já me basta à noite, pois tenho de tomar uns comprimidos para dormir. Então, quer falar comigo acerca da minha vida? Tenho pena em desapontá-lo, mas eu não tenho muita coisa boa para lhe contar. Tive uma vida muita dura, sabe? Passei uns maus bocados e alguma fome. Antigamente, vivia-se com pouco. Não podíamos exigir muito, pois as dificuldades eram muitas. Até aos cinco, seis anos, morriam muitas crianças. Comia-se mal e, em caso de febres e doenças, não havia dinheiro para ir ao médico. Havia anos, por causa do codo, que queimava tudo, em que nem couves havia para fazer o caldo. Para enganar a fome fazia-se uma sopa de água com unto ou de ramas de batata, de casca de favas e até de urtigas. Sobreviver a tudo isto era um milagre. A juventude de hoje não faz a mínima ideia de quanto a vida era dura antigamente. Estou convencida que a gente nova de hoje não aguentaria. Foi habituada a ter tudo e a não fazer nada. Por isso, não se esforça como devia ser. Ao menos que estudasse para compensar os esforços dos pais. Mas não vejo isso. A malta nem estuda como devia nem ajuda os pais. Não vejo os jovens preparados para enfrentar o que aí vem. As notícias que dão na televisão não são muito animadoras. O país está muito endividado. Quiseram viver todos à grande e à francesa à custa dos outros. E claro, não havendo trabalho, nada feito. Só espero que ainda sobre dinheiro para pagar os remédios e as pensões dos mais pobres. Mas até nisso, segundo dizem, também vão mexer.
Está a ver esta encosta, por aí acima? Desde criança era percorrida a pé e descalça, quer fizesse sol, quer caísse chuva. Muitas vezes, fui à feira a Lamego descalça e carregada, com uma côdea de pão para o caminho. Em dia de festa, como a de Nossa Senhora dos Remédios, ia descalça, levando os sapatos num saco, só os calçando no destino. Mas era uma alegria, pois púnhamos a conversa em dia com os nossos vizinhos e gentes das aldeias próximas. Desde pequena aprendi com a minha mãe o quanto era a vida dura para uma mulher. Cedo vi como se amassava a farinha, se acendia o forno e se cozia o pão, e logo comecei a ajudar. Também comecei muito nova a lavar a roupa. Era preciso branquear os lençóis já gastos e tirar o surro das calças, camisas e saias, ensaboando-as bem, mexendo aqui, torcendo ali, em horas seguidas de muito esforço. Depois de posta a corar e secar, engomava-a, como agora se diz, com um ferro já velho, bufando lá para dentro de vez em quando para que as brasas avivassem.
Comia-se do que havia. Mas se aparecia algum pobre, daqueles que andavam de terra em terra e nada tinham, porque eram doentes ou já não tinham forças para trabalhar, não iam embora sem lhes oferecermos uma malga de caldo ou um naco de broa. Naquele tempo, era a miséria e não havia reformas. Tínhamos de ser uns para os outros. Alguns dormiam para aí em palheiros e em lojas.
Era muito difícil ser mãe e ter filhos. Não havia consultas nem se ia para o hospital como agora. Conheço algumas mulheres que morreram ao tê-los. Eram ajudadas por uma mulher com experiência e era o que Deus quisesse. Por isso se dizia, quando uma mulher andava grávida, “oxalá o tenhas numa boa hora”. O único luxo, que vinha a seguir, era comer uma canja e ficar na cama, não por muitos dias. No terceiro ou quarto, já tinham de se levantar para a rotina do dia a dia, sabe-se lá com que sacrifício, porque a vida não podia esperar e, se as mulheres ficavam de cama, o mundo parecia que acabava lá em casa.

Crescer com a apanha de tojo
Nasci aqui perto, em Vales, no dia 18 de Abril de 1934. Éramos seis irmãos. Felizmente, ainda cá estamos quatro vivos. O meu pai andava ao dia aqui na freguesia de Barrô, S. Martinho de Mouros, Cambres e Penajóia. A minha mãe tratava dos filhos e de uma territas, onde se semeava e plantava o essencial para não se morrer à fome.
Não fui à escola. Para os meus pais era uma perda de tempo, pois tinha de trabalhar. Tenho pena de não saber ler nem escrever. Desde pequena comecei a ir ao tojo por esta serra acima. Íamos para lá de manhã e à tarde fazer molhos, que vendíamos a quatro e cinco escudos. O tojo era arrancado à enxada e apanhado à mão. É uma planta que até dá umas flores bonitas na Primavera, mas tem muitos picos. Tínhamos de lidar com elas sem luvas ou qualquer protecção. O tojo era para a renova das vides, servindo de adubo, sendo enterrado por altura do Natal e Janeiro. Era muito procurado pelos proprietários das quintas daqui de Barrô, Penajóia e S. Martinho de Mouros. Ao longo de todo o ano, também se vendia para estrumar os campos e as lojas onde estavam os animais. E até, junto de cada casa, se fazia uma estrumeira a partir de tojos e fetos, onde as pessoas despejavam os caldeiros de urina e faziam as necessidades.
Chegávamos a ir três vezes à serra. Por volta dos oito, nove anos já era obrigada a ir por aí acima. Tomávamos o mata bicho com uma côdea e um pouco de aguardente de manhãzinha, indo a maioria das vezes o sol nascer no monte. Chegávamos a juntar-nos cinquenta pessoas. Esta vida de ir e vir ao tojo durou até casar.

Após o casamento
Casei com vinte anos e o meu marido com vinte e dois. Namorámos um ano e chegou bem para nos conhecermos. Naquele tempo, a malta nova estava ansiosa por sair de casa dos pais para ser independente e ter vida própria. Agora, é o contrário; os jovens namoram anos, trabalham e querem continuar em casa dos pais, com comida e roupa lavada.
O meu marido andou na escola e sabia ler e escrever. Foi com cerca de doze anos para a Quinta de Noval, perto do Pinhão, onde era paquete, fazendo toda a espécie de recados, e levava a merenda aos trabalhadores. Foi levado por um tio, que era lá feitor. Vinha cá de quinze em quinze dias. Depois de casado, continuou a trabalhar na mesma quinta. Eu fui viver para Cêtos para uma casa pertencente aos avós do meu marido.
Tive um filho, o único, após cinco anos de casada. Mas era difícil endireitar a vida. Por isso, em 1968, o meu marido foi para França, juntamente com outros homens daqui. Pagou vinte e cinco contos a um angariador, que depois fez as contas com os passadores. Partiu com um saco às costas e nada mais em direcção à fronteira espanhola, onde teve de passar a salto para não ser visto pela guarda. Depois, meteu-se novamente no comboio até junto da fronteira francesa. Lá foi enfiado numa carrinha e andou por lá às voltas para enganar a polícia, tendo sido deixado numa montanha. Depois de subir muito e rapado muito frio, conseguiu chegar a terras de França.
Mesmo assim teve sorte. O meu marido contava-me que muitos não chegavam ao destino, pois eram enganados pelos passadores, que os deixavam abandonados, morrendo de fome e de frio ou afogados, vindo ainda alguns a cair pelos pedregulhos abaixo. Outros eram mortos ou apanhados pela polícia, que os recambiavam para cá e os castigavam.
Foram todos em busca de uma vida melhor, deixando a mulher e filhos, e acontecia-lhes isto. O meu marido esteve por lá seis anos, sempre na agricultura. Mas aquilo não dava assim tanto dinheiro. Tornou para junto de nós, indo ganhar o dia nas terras. Morreu já lá vão treze anos.
O meu filho também esteve emigrado uns anos juntamente com a mulher na Suíça. Tem uma barbearia em Resende e lá se vai governando. Vivo aqui nesta casa com ele e com a minha nora. Tenho dois netos.
Antigamente, era pior. Há noites em que me custa mais adormecer, pois começo a cismar e tenho de tomar um comprimido. De resto, tomara eu cá andar mais uns anos. A minha nora lá vai tendo paciência para me aturar e trata-me bem.

Tristezas não pagam dívidas
Mas nem tudo era mau. Quando íamos para as festas e feiras, era uma alegria. E mesmo no trabalho, quando nos juntávamos, era costume começarmos a cantar. E as pessoas ajudavam-se umas às outras naquilo que podiam.
Aos domingos à tarde, quando era nova, ia aos bailaricos, que eram organizados pelo Adriano da venda, aqui em Cêtos. A música vinha da grafonola. Ainda me recordo de ver o dono da venda a dar à manivela, punha um disco, baixava a cabeça da agulha e a maquineta lá tocava. Quando a corda começava a faltar, a voz ficava cada vez mais fanhosa e acabava. Outras vezes, arranjava-se um tocador de concertina ou outro instrumento.
Havia ainda as festas religiosas da freguesia e da região. E cheguei a ir algumas vezes à festa de Nossa Senhora dos Remédios. Levava uma merenda para aguentar a caminhada de ida e volta. Em Junho, divertíamo-nos na noitada de S. João. A gente nova fazia fogueiras nas eiras com pinhas e alecrim. Os rapazes e raparigas juntavam-se, saltando às fogueiras. Por esses dias, os rapazes lá conseguiam arranjar dinheiro para comprar bombas e sobretudo “rabioscas”, que atiravam para o meio das pernas das raparigas. E faziam muitas partidas durante a noite.
Um outro divertimento acontecia pelo Carnaval. Os homens faziam a comadre e as mulheres o compadre, que ficavam escondidos. No domingo gordo e na segunda e terça-feira de Entrudo faziam-se grandes bailaricos e corria-se o compadre e a comadre pelos caminhos. As raparigas levavam “em procissão” o compadre que tinham feito, sempre aos gritos, mas atentas aos homens, que faziam tudo para o roubar. Os homens faziam o mesmo, mas por outros caminhos, levando a comadre.
Durante o carnaval, as raparigas tinham de estar muito atentas. É que os rapazes apareciam repentinamente para darem “mantas em seco” às raparigas. Às desprevenidas, depois de as agarrarem, um pegava-lhe pela cabeça e outro pelos pés, e batendo-lhe com o cu no chão, diziam: “Um…dois…três…Um pró pai, outro prá mãe e outro pra quem o fez…”. Se quer acreditar, eu nesses dias evitava sair de casa e nunca fui apanhada.
Ficam-nos estas recordações de coisas que eram uma alegria. Às vezes, penso que antigamente sofria-se mais e até se morria mais cedo, mas as pessoas pareciam mais comunicativas. Não se pode ter tudo. Gostava que houvesse mais gente nova nas aldeias para animar isto. Custa-me pensar que estes campo irão ficar ao abandono e as casas desabitadas. Quem sabe se isto não irá levar uma volta?

Nota: “Histórias de uma vida…” é fruto de uma conversa não gravada, podendo não corresponder exactamente ao que nela foi afirmado.
*Apontamento da autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, número de Novembro de 2010

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Pedro Namora falou ao "Jornal de Resende": "Trago sempre Resende no coração"*

Ligações familiares a Resende

Tornou-se uma figura mediática com o despoletar do chamado escândalo da Casa Pia. Recordamos as suas aparições na televisão e a sua determinação na defesa das vítimas de abuso sexual. Pela sua vivência na instituição e pelos contactos e testemunhos que foi recolhendo junto destas crianças e jovens, foi-se persuadindo de que os mesmos não mentem. Para dar ainda mais ênfase e consistência a esta convicção publicou em 2005, com a chancela da Bertrand, o livro “ A dor das crianças não mente”, estando prevista para este mês a sua reedição na Alêtheia Editora. A defesa dos direitos das crianças, especialmente das abusadas, maltratadas e mais fragilizadas, transformou-se no combate da sua vida.

A sua persistência parece advir-lhe das suas raízes e dos ascendentes familiares no nosso concelho, que sempre tiveram de lutar por uma vida digna.

O Dr. Pedro Namora, embora nascido em Lisboa, está muito ligado a Resende. A sua mãe Alzira Namora, filha de Joaquim Namora e Maria do Céu Namora, nasceu em Cardoso, S. Martinho de Mouros. O seu avô era um comerciante muito conhecido e respeitado. Ainda retém com emoção a imagem de um grupo de idosos que se levantaram e tiraram o chapéu da cabeça quando referiu o seu nome aquando de uma das duas deslocações a Resende. No nosso concelho tem alguns primos dos quais destaca o Antoninho Namora e as irmãs, “pelo carinho, amizade e dedicação com que me receberam nessa terra maravilhosa”.

Questionado sobre o que representa Resende na sua vida, respondeu o seguinte:

“Por ser órfão desde muito cedo, o que sei do meu passado foi adquirido através de relatos dos feitos do meu avô, que nunca conheci. Resende é para mim uma terra mítica, que apesar de conhecer tão mal trago sempre no coração. Das duas vezes que visitei Resende fui a Cardoso, porque gosto de ver o eido, onde a minha mãe e tios foram criados, apesar da casa estar infelizmente adulterada. Aliás, se um dia tivesse possibilidades financeiras, o que é pouco provável, gostava de concretizar o sonho de reaver essa casa para que retomasse a traça original”.

Desejava muito poder reviver e passar temporadas nesse espaço, deixando-o como legado de um reportório de encontro de raízes familiares e de memórias aos seus três filhos, uma menina e dois rapazes, com 7, 10 e 13 anos, respectivamente.

Na Casa Pia de Lisboa

Pedro Namora nasceu em Lisboa em 1965. Por ser órfão de pai e pelo facto de a mãe não ter condições para o criar juntamente com a sua irmã, entrou na Casa Pia de Lisboa em 1971, com seis anos. Está grato a esta grande instituição que o educou e lhe moldou a personalidade. “A ela devo parte do que sou. Os princípios em que fomos educados e a existência de um magnífico corpo docente conferiram-me as bases para o futuro”, confidenciou-nos.

Guarda boas recordações dos onze anos de frequência. Foi ganhando consciência das vantagens da integração numa grande instituição, que foi interiorizando como uma família alargada de pertença, cuja educação era prestigiada e donde saíram muitas personalidades de relevo que se destacaram e destacam nas mais diversas áreas.

Reconhece também as desvantagens da institucionalização, como o abandono a que as crianças e jovens estavam sujeitos, a falta de carinho, a despersonalização e até “as torturas que eram infligidas por educadores sem perfil nem vocação para o desempenho das diversas tarefas, que implicam muito sentido de responsabilidade e de sensibilidade e qualidades de relacionamento”.

Confessou ter sido alvo de uma tentativa de abuso por parte de Carlos Silvino, “de que felizmente consegui escapar”, confessou. Naquele tempo, as coisas passavam-se muito em surdina. Comentava-se apenas que era necessário ter cuidado com aquele condutor e com alguns alunos, nomeadamente os que andavam sempre bem vestidos e com dinheiro e que tinham amigos estranhos, arranjados principalmente nos jardins circundantes.

A mãe, que entretanto também já faleceu, visitava-o sempre aos fins de semana e férias, indo a casa muitas vezes, ao contrário do que se passava com a generalidade dos seus colegas.

Curso de direito

Saiu da Casa Pia em 1981, com 17 anos e o diploma do 9.º ano de escolaridade. Nesse mesmo ano, após seis meses como empregado de balcão numa loja de fotografias, conseguiu entrar para a Associação Industrial de Lisboa como aprendiz de electricista, o que lhe permitiu recomeçar os estudos no ano seguinte. Com muita força de vontade, estudando à noite, completou o 12.º ano. Não satisfeito, abalançou-se a fazer o curso de Direito na Universidade Lusíada como trabalhador estudante, tendo concluído o 5.º ano sem nunca ter chumbado.

Actualmente, trabalha numa comissão de protecção de crianças e jovens e exerce advocacia, sobretudo em Lisboa, onde tem escritório.

Reacção à recente decisão do tribunal

Questionado pelo JR sobre a decisão do tribunal que condenou seis arguidos por abusarem sexualmente de menores da Casa Pia, a sua reacção foi de satisfação, porque representa o culminar de uma luta difícil com mais de oito anos. Segundo as suas palavras, “ficou provado que, ao contrário do que alguns andaram a dizer, as vítimas sempre falaram verdade e, talvez pela primeira vez em Portugal, criminosos com imenso poder foram investigados, julgados e condenados”.

De forma desassombrada, como é seu timbre, revelou que também era atingido por alguma insatisfação. Este sentimento devia-se ao facto de “tantas cadeiras terem ficado vazias durante o julgamento. E ao desrespeito que ainda persiste pela infância: se Portugal respeitasse as suas crianças, os seis arguidos deveriam aguardar os recursos em prisão preventiva”.

Palavra final

Pedro Namora teve oportunidade de contactar e conhecer muitos conterrâneos que demandaram Lisboa em busca de melhores condições de vida, numa altura em que as dificuldades eram muitas e até a fome imperava. “Assisti à forma heróica como, partindo do nada, souberam constituir família e triunfar na vida, sem nunca perderem orgulho na terra que deixaram por necessidade. Nunca conheci ninguém mais corajoso, honrado e leal”, referiu convicto.

Já mesmo na despedida, disse emocionado: “ Sinto-me orgulhoso por, tendo nascido em Lisboa, poder dizer que o sangue que me corre nas veias é de Resende”.

*Apontamento de autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, número de Outubro de 2010

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A ACADEMIA PORTUGUESA DA HISTÓRIA VAI CELEBRAR 190 ANOS*

Com um programa à altura da efeméride e que acabo de receber pelo correio com o respectivo convite, no próximo dia 8 de Dezembro, vai celebrar cento e noventa anos de vida e de trabalho a Academia Portuguesa da História, a mais antiga Academia do país, e uma das mais ilustres e beneméritas academias cientificas da nação.
Do programa, constam como actos principais uma celebração solene da Eucaristia na Capela do Colégio de S. João de Brito, e uma Sessão Solene no Salão Nobre da Academia, em que serão oradores especiais o Prof. Dr. Veríssimo Serrão, seu Presidente de Honra, a actual Presidente, Prof. Dra. Manuela Mendonça e o Secretário de Estado da Cultura, Dr. Elísio Summavielle.
A Real Academia da História Portuguesa (assim se chamava na sua primeira vigência), foi fundada pelo rei D. João V, por decreto de 8 de Dezembro de 1720 – dia da solenidade da Imaculada Conceição de Nossa Senhora - e teve como seu primeiro inspirador Manuel Caetano de Sousa, clérigo regular e grande homem de letras. O programa inicial da Academia era que “se escrevesse a história eclesiástica destes Reinos, e depois tudo o que pertencesse à história deles e das suas conquistas”.
Estimular e coordenar esforços tendentes ao rigoroso conhecimento da história nacional, no sentido de esclarecer a contribuição portuguesa para o progresso da Cultura e da Civilização, e promover a publicação sistemática de fontes documentais que interessem à História Portuguesa, são os grandes objectivos actuais da Academia.
Depois de um interregno de alguns anos, a Academia foi recriada pelo Decreto-Lei n° 26611, de 19 de Maio de 1936.
Constituída actualmente por 40 “Académicos de Número” (30 de nacionalidade portuguesa e 10 de nacionalidade brasileira), 46 “Académicos Honorários” (36 portugueses e 7 estrangeiros), 183 “Académicos Correspondentes” (84 de nacionalidade portuguesa, 18 de nacionalidade brasileira e 81 de outros países estrangeiros) e 91 “Académicos de Mérito” (24 portugueses e 71 estrangeiros), a Academia Portuguesa da História poderá definir-se como uma «agremiação de especialistas que se dedicam à reconstituição documental e crítica do passado», sendo igualmente o “órgão consultivo do Governo na matéria da sua competência» (art°. 3 dos respectivos estatutos).
Cada um dos seus membros, para além do seu diploma de académico, e do colar de honra que deve usar em todas os actos da Academia, possui um cartão de identificação que lhe facilita a entrada nos Arquivos e nas Bibliotecas Nacionais.
Como publicações habituais da academia, o “BOLETIM ANUAL” donde constam os nomes, o endereço e as obras publicadas por cada um dos seus académicos e as actas de todas as sessões realizadas ao longo do ano, e os “ANAIS”, onde são publicadas todas comunicações apresentadas na academia pelos senhores académicos.
A Academia, com uma Biblioteca riquíssima, tem actualmente a sua sede no Palácio dos Lilases - Alameda das Linhas de Torres, em Lisboa. É aí que se reúnem os senhores Académicos para debaterem os grandes temas da História, e para homenagearem os seus membros mais ilustres.
Como é costume dizer-se em bom latim
“AD MULTOS ANNOS”!
Resende, 25 de Novembro /10
*Joaquim Correia Duarte

terça-feira, 9 de novembro de 2010

HISTÓRIAS DE UMA VIDA… EM MIOMÃES: Chamo-me Henrique Saraiva e nasci em Miomães, há 88 anos*

Tempos de infância e juventude
Nasci em 11 de Março de 1922, já lá vão uns bons anitos. Ainda estou aqui rijo para o que der e vier. Sou de boa cepa, pois o meu pai viveu 87 anos e a minha mãe 90. Éramos 4 irmãos. Sou o único que continua vivo. Um deles teve um acidente com uma explosão de carboneto, que o deixou cheio de mazelas, tendo morrido pouco depois de uma queda, tinha então 18 anos.
O meu pai foi arrais no rio Douro; conduzia barcos de que era proprietário. Por isso, se chama arrais; um mestre governa qualquer barco. Começou como marinheiro. Depois, com dinheiro que foi juntando e outro emprestado, adquiriu 5 barcos. O primeiro tinha capacidade para cinco pipas. Os barcos, que serviam sobretudo para transportar vinho do Porto para as grandes casas de Gaia, mediam-se não por tonelagem, mas pela quantidade de pipas.
A minha mãe fazia e vendia rosquilhos nas feiras. Depois de casada, o meu pai trazia caixas de sardinha do Porto e ela ia vendê-la para S. Romão. Há até um episódio engraçado que vale a pena contar. Uma certa vez, a minha mãe encontrou uma sardinha muito grande, mas bastante moída. “Quem vai ficar com esta é o ferreiro, só preciso de lhe enfiar um chamiço para disfarçar”, pensou. E assim fez. Ficou danado. Quando a encontrou, disse: “quando quiser carvão, compro-o”.
Admiro muito o meu pai. Certa vez, o Sr. Padre Joaquim Correia Duarte perguntou-me quem era o homem que mais admirava e eu respondi: “o meu pai; se quiser, eu digo-lhe porquê”. Era um homem muito recto e trabalhador. Marcou-me a atitude que teve perante este facto que lhe vou contar e me atormentava. Um dia, já não podia mais e disse-lhe: “a Celeste está grávida”. Ao contrário do esperado, respondeu serenamente: “tudo se há-de arranjar; tens é de assumir as tuas responsabilidades; vai falar com o Sr. Padre e marca o casamento quanto antes”.
O meu jardim de infância foi o rio Douro. Com 3 anos, o meu pai punha-me a nadar agarrado a uma corda. Desde pequeno perdi o medo à água. Fiz a escola primária aqui em Miomães. O exame da quarta foi feito em Resende. Quando fui para a escola já sabia ler e escrever, ensinado pelo meu irmão mais velho. Sempre fui precoce em tudo. Também já sabia o nome dos reis de Portugal e muitos episódios de história. O professor até me punha a ensinar os colegas mais fracos. Quando terminei a escola, fui aprender a arte de alfaiate. Mas só lá estive 10 meses. Tinha de fazer só aquilo que o mestre entendia e ainda tinha de pagar. Um dia, meti-me num barco, que foi sempre o meu sonho, e fui até ao Porto como moço ajudante. Quando voltei, o mestre de alfaiate já não me quis lá mais. Por isso, fui para o Porto, para uma oficina de alfaiate, onde ganhava um escudo e cinquenta centavos. Depois de algumas malandrices, voltei cá para a terra e tentei continuar a aprender a arte de alfaiate, agora com um mestre de Oliveira do Douro.
Tinha 14 anos e fui num barco até ao Porto. Ao passar numa rua muito movimentada, vi um senhor a cortar peças de roupa e a fazer um fato, tudo com muita mestria. Fiquei estupefacto. Ao ver-me assim tão interessado, chamou-me e disse: “queres ver como se trabalha?; anda cá que eu ensino-te”. Fiquei com ele dois dias. Foi um verdadeiro curso intensivo. Saí de lá um verdadeiro mestre. Ainda me lembro bem do nome desse estabelecimento. Chamava-se “Casa Londres”. Cheguei cá a casa todo entusiasmado. Peguei num fato do meu pai, desmanchei-o e fiz um fato para o meu irmão mais velho. O meu pai nem queria acreditar. Comprou uns metros de cotim e disse: “agora faz um fato para mim”. Ficou impecável. A seguir fiz uma samarra para o Sr. Joaquim Pinto, de Miomães. Esta minha habilidade começou a constar e a clientela apareceu.
Fui alfaiate até aos 23 anos. Os fregueses só pagavam de ano a ano, com o dinheiro que faziam das colheitas ou do gado.

Depois do casamento
Casei com 21 anos e a minha mulher com 19. Era aqui vizinha e comecei a gostar dela desde catraia. Com 15 anos, não resisti. Um dia, ia a passar, chamei-a e disse-lhe: “não imaginas quanto gosto de ti; se dependesse só de mim, havia de casar contigo”. Vi que ficou muito satisfeita. Logo ali, não hesitou em responder-me que também gostava muito de mim. Na missa, ia sempre para o coro da igreja para a ver melhor. E os nossos olhares chegaram a cruzar-se muitas vezes.
Quando casámos, fomos viver para uma casa dos meus pais. Com uma filha para manter, não podia continuar a viver da arte de alfaiate, já que as pessoas só pagavam de ano a ano. Mudei de ramo. Dediquei-me a comprar folhas de loureiro, tília e cornelhos, que depois vendia no Porto. O dinheiro para o negócio era emprestado pelo Sr. Jerónimo Moreira, talvez o maior comerciante do concelho de Resende. Um dia, como fazia regularmente, fui vender a mercadoria, mas o senhor Emílio Vilar disse: “tenho muita pena, mas o preço do cornelho baixou muito e eu não te posso pagar mais que isto”. Nessa altura, perdi bastante dinheiro, mas mesmo assim fiz bem, pois o cornelho ainda baixou mais.
Com o dinheiro que tinha juntado, comprei uma casa por 25 contos, tendo dado de entrada 10 contos. Depois de fazer algumas obras, montei uma mercearia e tasca. Mas tive vários problemas com este negócio, por causa da venda do vinho. Preferia não vender a indivíduos já tocados; os bêbados eram expulsos. Cheguei a andar à porrada por causa disso. E naquele tempo também havia muitos fiados. Atingi doze contos de dívidas. Tinha então 30 anos e 4 filhos para manter.

Em Angola
Para dar um novo rumo à vida, resolvi ir para Angola. Naquele tempo, era preciso uma carta chamada, que consegui com alguma facilidade. Segui primeiro. A mulher veio depois com quatro filhos e uma filha de três meses, que não conhecia, pois, na altura em que embarquei, ainda estava na barriga da mãe.
Comecei a trabalhar numa cervejaria, no dia 29 de Setembro de 1952. O emprego ficou apalavrado no dia 28 para começar a trabalhar no dia 1 de Outubro. Mas eu disse: “vou já amanhã, mesmo que trabalhe de graça dois dias. No fim de Outubro era para receber 1 conto e 800, mas deram-me 2 contos. A cervejaria chamava-se Biker e cheguei a receber um prémio por ter sido considerado o melhor tirador de cerveja. Estive aqui 15 meses.
Depois adquiri um alvará de uma loja comercial para trabalhar por conta própria, mas fui vigarizado, pois vim a verificar que só estava autorizado a vender fruta e hortaliça. Ao cabo de 2 meses, tive de me desfazer do negócio.
Vi-me assim desempregado, com mulher e 5 filhos para sustentar. Um senhor, ao saber da minha situação, sugeriu-me que me dedicasse à distribuição e venda de camarão, tendo-me emprestado 500 escudos. Sei que no primeiro mês ganhei 6 contos, vendendo camarão pelos cafés e até em casas particulares. Um dia, cheguei à conversa com uma senhora que ficou admirada por ter cinco filhos e disse-me para ir lá a casa lanchar com a família. Nessa tarde, foi dizendo: “por que não vai para um serviço do Estado?; sempre é mais seguro, tem garantia de reforma e abono da família…; dê-me o seu bilhete de identidade; na sexta-feira vem cá o Director Geral dos Correios e eu vou falar-lhe no seu caso”.
E fui bem sucedido. Perguntaram-me se sabia ler e escrever. Fiz um ditado e nem um erro dei. Fiquei colocado na central dos correios de Luanda. Entretanto, tive um desentendimento com um chefe de secção e fui para Moçâmedes. Aqui vim a fazer o antigo segundo e quinto ano, que completei em dois anos. Ainda estava aqui quando a minha mulher apanhou o vírus do deserto. O médico disse-me: “se queres mulher, manda-a para a Metrópole, que ela cura-se logo”. E assim foi. Veio ela e mais dois filhos, tendo um deles entrado no seminário de Resende.
Em 1957, concorri para o serviço das alfândegas. Já o tinha feito antes, mas na altura não tinha o registo criminal. Apresentaram-se cento e trinta e três concorrentes, tendo ficado em primeiro lugar. Quando soube da novidade até desmaiei. Quem me deu posse foi o director da alfândega de Mocâmedes, o Sr. Areosa, que era irmão do Dr. Areosa, conhecido médico em S. Martinho de Mouros. Fui colocado em Novo Redondo, onde estive dois anos. Depois, em 1959, vim para Luanda para os serviços centrais, onde fui o responsável pela montagem e organização de todo o arquivo das alfândegas.
Viemos cá de férias em 1963 e 1970. Com a descolonização iniciada com o 25 de Abril, regressámos definitivamente em Novembro de 1974. Do tempo que estive em Angola só me contaram 22 anos para a reforma. Cá, ainda abri uma mercearia, que passei depois a um dos filhos.

Incursão pela política, poesia e muitas histórias para contar
Com o 25 de Abril, o clima era propício para se fazer qualquer coisa pela sociedade e pela mudança da situação no nosso concelho, onde estava tudo muito parado. A forma de o fazer era a militância num partido. Por ser o que mais se aproximava da defesa dos meus valores e da minha formação, filiei-me no CDS, tendo sido presidente da comissão concelhia durante 13 anos. Na sequência das primeiras eleições autárquicas, fui vereador nos anos de 1978 e 1979, em substituição do Sr. Couto. Mais tarde, também em regime de substituição, voltei a ser vereador em 1988 e 1989. De uma das vezes, instigado pelo Prof. Adriano Moreira, fui cabeça de lista e candidato a presidente da Câmara. Foi uma época bem agitada da vida. Acho que dei o meu contributo válido à vida política local. E também aprendi muito do carácter das pessoas.
A propósito da política e do carácter, lembro-me de um episódio que me marcou para toda a vida. Era eu ainda garoto e discutia-se na altura quem tinha feito determinada asneira. Nisto aparece uma tia minha que disse convicta: “o meu sobrinho não fez isto; o meu sobrinho não mente”. Esta frase influenciou-me tanto que, se não mentia no passado, nunca mais poderia mentir.
A minha mulher sempre foi tudo para mim. Infelizmente, já morreu há quinze anos; tinha ela setenta e um anos. Comovo-me sempre quando falo nela. Foi mesmo o único e grande amor da minha vida. Os meus dois livros de poesia, “Flores de Outono” e “Flor Silvestre”, são-lhe justamente dedicados, sem esquecer os meus seis filhos, nove netos e uma bisneta. Sempre gostei de fazer rimas. Cheguei a ganhar um prémio, em Novo Redondo, a propósito da Gazcidla, com esta rima bem singela: “Já Eva dizia ao Adão/Sem Gazcidla não, não e não”.
Em Angola, colaborei em vários jornais. Agora, felizmente convidam-me para falar nas escolas. Já fui também várias vezes ao Museu Municipal contar às crianças como era a vida ligada aos barcos rabelos e ao Douro e até já criei para eles muitas histórias e lendas. Gosto muito de comunicar, respondendo às perguntas e curiosidades das crianças. O novo projecto, previsto para o ano, é falar/animar grupos de pessoas idosas.

Nota: “Histórias de uma vida…” é fruto de uma conversa não gravada, podendo não corresponder exactamente ao que nela foi afirmado.
*Artigo de autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, número de Outubro de 2010

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

A implantação da República em Resende*

A revolução republicana de 5 de Outubro de 1910, apoiada pela Maçonaria e Carbonária, teve o seu início na madrugada do dia 4 de Outubro, em Lisboa. É marcada por uma insubordinação, que se iniciou num quartel de Lisboa e que depois se alastrou por vários locais da capital como Alcântara, a Rotunda e o Rossio. Terminou na manhã de 5 de Outubro com a proclamação vitoriosa da implantação da República, anunciada por José Relvas da varanda da Câmara Municipal de Lisboa.
Apesar de, geograficamente, a revolução se ter circunscrito apenas a Lisboa, o resto do País aderiu à República. Como afirmava um jornalista da época, “o resto do País soube da implantação da República por telegrama”, todavia, aceitaram-na e, em muitas povoações, regozijaram-se com o acontecimento, não se registando manifestações contrárias, nem militares nem civis.
Foi o caso de Resende. No nosso concelho, onde a “notícia da mudança das instituições” foi recebida com “grande enthusiamo”, a República foi proclamada no dia 11 de Outubro de 1910, pelo Presidente da Comissão Municipal Republicana do concelho, João Canavarro Crispiniano da Fonseca, nos paços do concelho (actual quartel da G.N.R.), que, perante “enorme concorrencia do público”, leu a seguinte proclamação enviada da capital:
“Concidadãos! Está finalmente libertada a glorioza Pátria Portugueza! Depois de um longuíssimo período de verdadeira escravidão e violenta opressão, raiou enfim a aurora luminosa da liberdade!”
Finda a sessão, “coberta por inumeras assignaturas de pessoas de todas as categorias sociaes”, foi içada a bandeira Republicana na fachada dos paços do concelho, “tocando então uma phylarmonica a «Portugueza», ao mesmo tempo que subiam ao ar duzias de foguetes e se ouviam freneticos vivas de acclamação”.
Transcrevemos os relatos publicados, em 12 de Outubro de 1910, pelo correspondente no concelho de Resende do Comércio do Porto, que constituem um importante documento histórico para o conhecimento integral da implantação da República no nosso concelho:

Rezende, 10 – Com grande enthusiasmo se recebeu aqui a notícia da mudança das instituições, sendo enorme a anciedade nos primeiros dias.
Ante-hontem tomou posse da administração d’este concelho o nosso amigo snr. dr. João Canavarro Crispiniano da Fonseca, chefe republicano local e distincto advogado, tendo o acto enorme concorrencia de amigos e correligionarios.
Amanhã será proclamada a republica nos paços do concelho e investida na posse a commissão republicana.
Preparam-se grandes festejos.

Rezende, 11 – Acaba de tomar posse a comissão municipal republicana d’este concelho, ficando presidente o dr. João Canavarro e vogaes effectivos: Aquilino Borges Carneiro, dr. Joaquim Antonio Vaz Pereira, dr. Adriano Anthero Cardoso Vieira, dr. José Joaquim Loureiro Dias, dr Manoel Joaquim Esteves e dr. Antonio Aurelio Pereira Monteiro de Araujo; substitutos: Antonio Loureiro da Fonseca, Jeronymo Pinto Moreira, Joaquim de Vasconcellos, Antonio Alexandre Gonçalves, Raphael Pinto da Fonseca, Antonio Teixeira do Amaral Cirne e Alberto Pinto Osorio.
Com enorme concorrencia do público, declarada aberta a sessão pelo presidente com a annuencia da anterior vereação, foi proclamada a republica, lendo o presidente a proclamação.
Em seguida, n’uma brilhante oração, fez a apologia do novo regime, sendo muito applaudido.
Fallaram depois Máximo Rangel e dr. Vaz Pereira, terminando por enthusiasticos vivas á republica e á patria portugueza.
A proclamação foi coberta por inumeras assignaturas de pessoas de todas as categorias sociaes.
Levantada a sessão em signal de regozijo, foi içada a bandeira republicana pelo sargento José Pinto Ferro, de artilheria 4, tocando então uma phylarmonica a «Portugueza», ao mesmo tempo que subiam ao ar duzias de foguetes e se ouviam freneticos vivas de acclamação. Enthusiasmo delirante.
* Texto de Paulo Sequeira, publicado no Jornal de Resende, número de Outubro de 2010

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

HISTÓRIAS DE UMA VIDA… EM PAUS: Chamo-me Adelaide de Jesus e nasci nos Carvalhos, Paus, há 84 anos*

Gosto de viver
Nasci a 18 de Julho de 1926. Ultimamente, neste dia, os meus filhos e vizinhos mandam fazer um bolo e cantam-me os parabéns. Ainda vou tendo força para apagar tanta vela. Todos se riem, mas eu também acho graça. Só é pena eu não gostar de doces. Quando fiz 80 anos, juntou-se muita gente. Tenho muitos amigos e todos me querem bem. Ando sempre com este telemóvel para as pessoas poderem falar comigo. Quando toca, carrego aqui neste botão e começo a conversa. Até de Espanha, a minha filha e netos me telefonam a saber se estou bem.
Rezo muito pelos que já partiram para que estejam em bom lugar, mas gosto muito de cá andar. Quando o meu Zeferino estava muito mal da doença, disse-me: “Adelaide, não te aflijas que eu ao cabo de meio ano mando-te chamar”. Realmente andei muito aflita durante seis meses, com medo que ele me mandasse uma carta de chamada. Pensei que Nosso Senhor lhe ia fazer a vontade. Nem dormia. Pensava para comigo todos os dias “será hoje que me vai dar uma coisa ruim e amanhã já não acordo?”. Aquelas palavras do meu Zeferino pareciam um cutelo em cima do meu pescoço. Quando passou o meio ano, foi um alívio. Afinal, ele não precisava lá em cima da minha companhia e governa-se bem sem mim. Nós aqui em baixo precisamos da companhia uns dos outros, mas as alminhas que fiquem descansadinhas lá em cima.
Sempre gostei de ir, logo de manhãzinha, quando o tempo está bom, até ao campo, lá abaixo da igreja. Vou devagarinho, mas faz-me bem. Demoro quase três quartos de hora a pé. Tiro as ervas, sacho ou deito a água. Claro que a cava da terra, as sementeiras, a poda e os serviços mais pesados ficam por conta do meu genro. Depois volto para casa. Faço o almoço e descanso qualquer coisa. Durante a tarde, converso com vizinhos, arrumo a casa e trato das pitas. A sua irmã e o seu cunhado estão sempre prontos a ajudar-me e fazem-me muita companhia, sobretudo no inverno. À noite, como uma refeição mais ligeira. Deito-me por volta das dez horas. E fico a rezar.
Ao sábado à noite e ao domingo, o meu filho Zé, que nos últimos meses é responsável por umas obras no norte de Espanha, vem comer comigo. Faz uma viagem tão longa para só para me ver.

Doença de bronquite
Tal como a minha mãe, sofro muito de bronquite. No inverno e sobretudo em dias de nevoeiro, falta-me muito o ar. É um mal-estar muito grande. Quero falar e não posso. Tenho aqui uma bombas de ar para quando me vejo aflita. No inverno, sou obrigada a bombar mais. Chego a dar quatro ou cinco bombadas por dia. Agora, no calor, quase que não é preciso bombar.
No inverno passado, vi-me muito atacada e tive de ir ao Centro de Saúde numa ambulância. O Sr. Doutor viu a coisa tão ruim que me mandou para o hospital de Penafiel. Estive lá vários dias internada. Fizeram-me lá muitos exames e davam-me muitos medicamentos. Às tantas não sabia a quantas andava, qual era o dia da semana. O que mais pedia às senhoras enfermeiras era ter alta para vir para a minha terrinha e estar na minha casinha. Mas elas diziam sempre “tem de ter paciência; daqui a uns dias”. Recebi lá muitas visitas. Mas se continuasse lá ficava pataroca. Aqui, fica-se logo a saber a quantas andamos.
Depois de vir do hospital, fui para casa da minha filha, a Céu. Vinha muito fraquinha. Agora, sinto-me bem. Passo as tardes na minha casa. Trato das pitas e falo com os meus vizinhos, mas à noite vou comer e ficar em casa da minha filha.

A servir como criada
Não cheguei a conhecer o meu pai; devia ter meio ano quando ele morreu. A minha mãe morreu com sessenta anos, já estava eu casada. Fui várias vezes com ela ao Sr. Doutor Albininho da Póvoa, quando ela estava mais aflita da bronquite. Depois dele a escutar, sentia-se mais aliviada.
Vivíamos numa casa arrendada nos Carvalhos. O meu pai sempre trabalhou no Douro o ano todo. Vinha cá de vez e quando. A minha mãe cuidava dos filhos e fazia umas hortitas por empréstimo. Éramos seis irmãos, três rapazes e três raparigas. Eu sou a única que está viva.
Nenhum de nós foi à escola. Íamos aonde? Não havia. A minha escola foi o trabalho desde pequena.
Tinha prá aí doze anos quando fui servir para casa da doceira de Pimeirol. A patroa fazia cavacas. Eu fazia a limpeza lá de casa e tratava da criação. O marido já tinha morrido e era caçador. Um dia, a patroa, para se rir comigo, meteu um cartuxo na arma e disse-me com voz grossa a imitar o marido: “ó Adelaide, ó Adelaide, pega lá a arma e dispara que há aqui ladrões”. Assim fiz, fui para uma varanda e carreguei no gatilho. Ó homem, a arma deu um coice danado e fugiu-se-me das mãos. A patroa muito se riu, mas eu fiquei muito atrapalhada, pois fumegava por todos os lados.
O destino a seguir foi ir servir para casa da D. Maria do Fornelo, mulher do Sr. Zezinho. A cozinheira era a Sra. Madalena da Talhada. Eu ajudava, fazia as camas e a limpeza.
Servi também na Casa dos Almeidas do Origo. Ainda me recordo do velho professor Almeida a passear para lá e para cá, depois da ceia, enquanto ia cantarolando “Pró céu, pró céu quero ir/Se pró céu queres ir/Não deves roubar nada/Se tiveres roubado/Tens de restituir”. Esta lenga-lenga era cantada sempre com um livro na mão.
Estive a trabalhar ainda em casa da D. Agostinha, em S. Martinho de Mouros. O marido e a mulher eram professores. A certa altura, decidiram ir viver e trabalhar para o Porto e queriam levar-me com eles. Mas eu não quis ir, pois já namorava aquele que viria a ser meu futuro marido. Mas foram boas pessoas, pois deram-me uma mala cheia de roupa.

Percurso após o casamento
Conheci o meu marido quando ele e um seu irmão trabalhavam no cemitério de Paus. Cruzei-me com ele, trabalhava eu em casa do Sr. Zé Domingues. Quando descia o povo para apanhar caldo, dava com eles. Às vezes, metiam-se comigo. Lembro-me do meu futuro cunhado dizer: “não me dá aí um caldinho?”. Mas o Zeferino ajuntou logo: “quem precisa mesmo de um caldinho sou eu”. Um dia, disse: “ó menina, posso dar-lhe uma palavrinha?”. E pediu-me namoro. A minha mãe não se importou. Ele era natural do Cimo de Resende e vinha namorar comigo todos os domingos. Namorámos um ano.
Casei com dezanove anos e o meu marido com vinte e três. O casamento foi na igreja de Paus. Houve um almoço melhorado de arroz e carne. A minha mãe trabalhava na altura prós fidalgos do Fornelo e foram eles que deram a carne, bastante gorda, por sinal.
Como uma tia minha era criada do velho Padre Joaquim, fomos morar para uma casinha ao lado da dele. O meu marido continuou a trabalhar como trolha e eu ia tratando de umas hortinhas.
Como as bocas para comer eram cada vez mais (tive cinco filhos, um deles infelizmente já faleceu), tive de fazer pela vida. Montei uma tenda. Aos domingos e nas festas, o meu marido acompanhava-me. Durante a semana, andava sozinha ou com o meu filho mais velho. Ia para a serra, percorria a Panchorra, a Gralheira, Campo Benfeito, Cutelo…Cá, em baixo, ia de terra em terra, Paus, Barrô, S. Martinho de Mouros, S. João de Fontoura…Batia todas as feiras e fazia todas as festas. Vendia gaitas, balões e brinquedos. Às vezes, quando estava sozinha, roubavam-me mais do que aquilo que vendia. Sabe como é. Quem me fornecia o material era uma casa da Régua. Trazia os artigos de comboio e saía em Porto de Rei. Depois trazia o cesto à cabeça por aí acima.
Mais tarde, entreguei-me de um moinho, pertencente ao Herculano da Póvoa. Moía o milho e os cereais de Moumiz, Quintãs, Lages, Formigal, Origo e outras povoações da freguesia. Tinha uma jerica para transportar as taleigas. Tirava 3kg por arroba quando o transporte era por nossa conta e 1,5Kg, quando iam lá levar os cereais e buscar a farinha. Era muito canseira, mas a gente tinha de se agarrar a qualquer coisa. Deixámos este negócio, porque houve problemas em fazer a escritura definitiva.
Entretanto, surgiu a oportunidade de comprar umas territas abaixo da igreja, junto ao rio Bestança. E começámos a trabalhá-las mais os filhos, já que o meu marido nunca deixou a arte de trolha, aproveitando todos os dias que apareciam, já que sempre davam mais qualquer coisa.

Morte do marido e esperança no futuro
Sem ninguém esperar, o meu marido começou a ter dificuldade em engolir. Fomos ao médico, que mandou fazer uns exames. E aconteceu o pior, pois acusaram uma doença ruim, um cancro na garganta. Ainda esteve internado nos hospitais de Coimbra, tendo vindo depois para Resende. Mas os médicos desenganaram-nos, dizendo que não havia nada a fazer e o melhor era vir morrer a casa, descansado, junto à família. Teve consciência de tudo quase até ao último minuto. Sofreu muito, pois custava-lhe muito comer e até beber. Morreu com sessenta anos. Ainda me chegou a dizer: “Adelaide, tu ficas muito nova”; eu sossegava-o: “está descansado que eu não quero mais homem nenhum”. E assim foi. Nunca me interessei por mais ninguém.
Para governar a vida, depois da morte do meu marido, tive de dar dias fora. Ainda cheguei a trabalhar bastante aqui com a nossa vizinha, a D. Amélia. E tive que arranjar dinheiro para pagar as quotas da Casa do Povo de S. Martinho.
Entretanto, os filhos casaram-se ou saíram de casa. Só ficou o Aurélio, que infelizmente morreu.
Com a reformazinha e as curiosidades que se tiram do campo, lá se vai vivendo. Muito melhor que antigamente. Tomaram os meus pais ter a vida que eu tenho. Haja saúde. Não preciso de medicamentos para dormir e isso é bom. Não gosto de ver televisão. Mas mesmo assim lá vou sabendo as notícias. Para saber misérias não vale a pena. Aquilo agora são só desastres, incêndios, terramotos e mortes. Prefiro ir sabendo o que se passa aqui na terra, que normalmente é sempre o mesmo. Nunca fui pessoa de sair muito de casa. Em solteira também não ia muito a bailes e faziam-se por aí alguns. Mas ainda sou pessoa de ir às festas da freguesia e ao festival do rancho. Olhe, há três anos o doutor dos Carvalhos convidou-me para subir ao palco e dançar e lá fui.
Antigamente, punha-se tudo em pratos limpos nas vessadas. Era tudo cantado à desgarrada: namoros, desavenças, amizades com os padres…Não se nomeava ninguém, mas todos entendiam. Às vezes, as vessadas do outro lado respondiam. Era uma animação, mas era um canseira muito grande. Isto servia para abafar a fome.
Era tudo muito lindo, mas era trabalhar até morrer. Não eram precisos lares da terceira idade, que poucas pessoas chegavam a velhinhas. Só os tolos desejam voltar ao antigamente.

Nota: “Histórias de uma vida…” é fruto de uma conversa não gravada, podendo não corresponder exactamente ao que nela foi afirmado.
*Apontamento da autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, número de Setembro de 2010

domingo, 10 de outubro de 2010

RESENDE NA PRIMEIRA REPÚBLICA*

Ex.ma Senhora representante da Câmara Municipal, profª Dulce Pereira

Ex.. ma Senhora Presidente do Rotary Club de Resende

Senhores Rotários

Ex.mos Senhores Professores e alunos da Universidade Sénior

Senhores Convidados

Minhas Senhoras e meus senhores

Sólon, ilustre poeta, sábio legislador e pai da democracia ateniense, que viveu no século VI a. C., ao ver-se em estádio adiantado na sua caminhada existencial, costumava dizer e repetir:

Envelheço todos os dias mais um pouco, aprendendo mais, aprendendo sempre, sem nunca me cansar de aprender.

No “Jornal de Resende” do passado mês de Julho, com compreensível gáudio e natural contentamento da minha parte, li a notícia da tomada de posse da senhora dra. Carla Silva como presidente do Rotary Clube de Resende e da sua intenção de prosseguir os trabalhos de implementação de uma Universidade Sénior, aqui, na vila e no concelho, para utilidade e estímulo dos resendenses menos jovens que desejem continuar a desenvolver as suas capacidades literárias e artísticas e a enriquecer ainda, e sempre mais, o acervo já bem rico das suas experiências de vida nos caminhos que trilharam. Não imaginava eu nessa hora que tão depressa se concretizasse esse sonho e que me coubesse a mim a honra de abrir as actividades da escola com esta simples e despretensiosa comunicação.

Muito obrigado!

Quando a Dra. Anabela Oliveira, ilustre coordenadora do projecto, me dirigiu tão honroso e amável convite, fiquei na dúvida sobre o tema que haveria de abordar na circunstância. Atendendo porém à data deste soleníssimo acto de abertura e à efeméride que o país inteiro celebra nestes dias, achei oportuno e interessante falar um pouco do que se terá passado em Resende na implantação do novo regime e em todo o período da Primeira República, desde a revolução de 5 de Outubro de 1910 até ao golpe militar de 28 de Maio de 1926.

Não é fácil fazer a história de um período da nossa vida municipal de que não existem outras informações para além das actas da Câmara, que pouco dizem, e de uma outra notícia resumida e rara, enviada daqui para os jornais do Porto.

Mesmo assim, e apesar de tudo, espero corresponder de algum modo ao que poderiam esperar de mim.

Minhas Senhoras e meus senhores

Para compreendermos melhor o fenómeno da República cujo centenário estamos a celebrar, permitam que eu faça uma súmula rápida e despretensiosa sobre o caminho da nossa história política e social.

Nascidos como nação independente em meados do século XII, e sendo um dos mais velhos países do continente europeu, vivemos os muitos séculos da nossa gloriosa e longa história num regime de monarquia hereditária.

Sob a tutela e orientação de um rei ou de uma rainha, cuja sucessão estava regulada por leis próprias que alguns, ainda hoje querem reportar às discutidas e quiçá lendárias Cortes de Lamego, mas também, e em simultâneo, com uma longa experiência democrática de âmbito essencialmente municipal, fomos cavando alicerces, abrindo caminhos, alargando fronteiras, domando mares e oceanos, desbravando florestas e sertões e construímos um grande império, talvez o maior império de sempre, com espaços e pessoas em todos os continentes.

Aquele século XV foi um século inolvidável.

Levamos o Evangelho, a Língua e a Cultura Portuguesa aos mais recônditos lugares da terra e aí deixamos marcas indeléveis e incomparáveis da nossa civilização cristã, plural e humanista.

Ao longo de mais de um século, Portugal foi o âmago real do mundo, e Lisboa, o grande empório do comércio e o ponto de encontro de várias civilizações.

Alexandre Herculano achava que fora possivelmente um destino honroso e privilegiado que Deus nos dera, e que nós cumprimos com zelo, audácia e dedicação.[1]

Queridos ouvintes

Ao longo da nossa monarquia, nuns reinados mais e noutros menos, os soberanos sempre se conduziram como príncipes aparentemente respeitadores dos interesses do país. Pesem embora as questões havidas entre os reis, por um lado, e o clero e a nobreza, pelo outro, frequentes, a verdade é que os nossos monarcas sempre deram ouvidos às queixas e às reivindicações da população. As chamadas Cortes, convocadas periodicamente por eles próprios, eram verdadeiros espaços de diálogo, em que os representantes da nação faziam ouvir as suas queixas e apresentavam os seus alvitres em ordem à boa governação.

Tal costume, entretanto, foi-se esbatendo cada vez mais a partir de D. João II e desapareceu mesmo, por algum tempo, com o rei D. Manuel I.

“Senhores do Comércio e da Conquista”, tinham os dois monarcas enormes benesses para distribuir aos grandes do reino que, desse modo, se lhes mantinham fiéis e viviam controlados. Foi esta a primeira experiência manifesta ou a primeira fase enfática do absolutismo régio em Portugal.

O problema viria a agudizar-se ao longo dos séculos XVII e XVIII. Aos poucos, os monarcas europeus e também os portugueses, foram impondo cada vez mais a sua autoridade indiscutível, estendendo o seu domínio absoluto à vida social, política, económica, cultural e religiosa e abatendo todos os que de algum modo pusessem em questão essa mesma autoridade.

“L’Etat cest moi! – dizia Luís XIV, o conhecido “Rei-Sol” que governou a França no início do século XVIII.

Em Portugal, a um D. João V, magnânimo e opulento, que não precisava de nada nem de ninguém, com o muito ouro que lhe vinha do Brasil, sucedeu um D. José insonso, mais interessado na caça e no teatro do que na governação do país. O seu reinado, entregue a um ministro ambicioso e plenipotenciário – o Marquês de Pombal - vestiu a pele e as atitudes de um intolerável e incrível despotismo. Basta recordarmos a expulsão geral dos padres jesuítas e o enforcamento público de diversos fidalgos que lhe eram desafectos.

A este absolutismo poderoso e prepotente, responderam em França os filósofos da Enciclopédia, proclamando a igualdade de todos os homens, a necessidade de se pôr fim aos privilégios de pessoas e de grupos e a urgência de o poder ser repartido.

Tais ideias, trazidas até Portugal no início do século XIX pelas Invasões Francesas e logo depois pelas folhas e jornais que chegavam de Paris, foram germinando e crescendo aos poucos na mente da burguesia portuguesa e foram o rastilho que veio a acender a revolução liberal de 1820.

Resende orgulha-se por ter tido na preparação de tal mudança, como figura de topo e membro destacado do Sinédrio, um dos seus notáveis filhos: o juiz Manuel Borges Carneiro, da Casa das Cotas.

Com a revolução liberal, a monarquia baseada até então no poder absoluto e indiscutível do rei ou da rainha foi substituída por uma Monarquia Constitucional, com uma lei a balizar os poderes dos dirigentes e uma regra a definir os direitos dos cidadãos.

O que aconteceu, porém, é que o país mergulhou pouco depois numa guerra civil entre os saudosistas do Antigo Regime e os entusiastas das novas ideias expressas na Constituição e, para além da guerra civil, generalizaram-se as ambições da média e da grande burguesia (proprietários, comerciantes e burocratas), na conquista rápida de lugares, de títulos e de propriedades, a desinteligência dos partidos, a instabilidade na governação e o aproveitamento corrupto das cadeiras do poder.

Para se obter um lugar de deputado nas Cortes, vendia-se então a alma, a consciência e a própria dignidade. Eça de Queiroz, cultor da grande escola realista na literatura portuguesa do século XIX, um dos maiores críticos da política do tempo e da sociedade da época, deixou essas ambições magistralmente retratadas na pessoa e nas atitudes do nosso fidalgo da Torre, Gonçalo Mendes, no seu imortal romance “A Ilustre Casa de Ramires”. [2]

No meio de tudo, o arranjismo, a pobreza mental e o oportunismo dos políticos, o parasitismo de muitos em relação ao Estado e a passividade da maioria em relação aos inúmeros e graves sintomas da decadência social - o que levava Alexandre Herculano a chamar a Portugal uma “nação decadente”. [3]

Henriques Nogueira, o primeiro e principal ideólogo da República, escrevia o seguinte logo nos meados do século XIX:

“quisera que, num país como o nosso, emancipado por cruentos esforços da tutela humilhante, egoísta e sanguinária da monarquia absoluta, cansado do regímen espoliador, traiçoeiro e faccioso da monarquia constitucional, necessitado de restaurar as forças perdidas em lutas estéreis e de cicatrizar feridas que ainda gotejam, ávido, enfim, de gozar as doçuras da liberdade por que tanto há sofrido,(quisera que) o governo do Estado fosse feito pelo povo e para o povo, sob a forma nobre, filosófica e prestigiosa de REPÚBLICA”. [4]

A instauração de um regime verdadeiramente democrático – um governo do povo em favor do povo – implicava necessariamente o derrube da monarquia.

Basílio Teles, um dos ideólogos da República, em resposta à pergunta sobre o programa do partido republicano que então se ia delineando lentamente, assim deixava escrito: “A Monarquia, em Portugal, tem sido isto: a incompetência, o impudor, a opressão. E concluía: “não há senão um acto de caridade a contrapor: a demolição sumária do regime”. [5]

Na mente dos defensores de uma nova ordem, e sobretudo nas suas actividades de propaganda, a Igreja Católica aparecia entretanto estreitamente aliada ao regime que se queria derrubar. O anticlericalismo, filho do positivismo francês, dominava as mentes e os corações dos vanguardistas da República

Nas vésperas e nos dias da revolução, ser republicano era, antes de mais, ser contra a Monarquia e contra a Igreja, particularmente contra os Jesuítas. A Igreja tinha nas suas mãos e ao seu cuidado, desde os tempos medievos, o ensino e a assistência do país e exercia uma enorme influência nas mentalidades e na vida da sociedade portuguesa, o que não era bem visto nem aceite pelos livres-pensadores. Para derrubar a monarquia, entendia-se que era necessário também desacreditar a Igreja, chamando-a, entre outras coisas, retrógrada e obscurantista.

Estando a monarquia cada vez mais desacreditada, mesmo aos olhos de muitos ilustres monárquicos, a ideia da República aparecia então aos olhos dos seus defensores com a aura de um certo messianismo vago e mal definido, mas suficiente para se acreditar que bastava a sua proclamação para libertar o país de todas as injustiças e salvá-lo de todos os males.

Sonhava-se com um regime perfeito “ do povo para o povo”, baseado numa completa igualdade e cimentada na chamada justiça democrática.

No último lustro do século XIX, as gerações mais jovens do país já não acreditavam mais no regime monárquico constitucional. A este caldo favorável à mudança, habilmente aproveitado pelo Partido Republicano criado em meados da década de 1870, veio juntar-se a crise económica europeia de 1890 que trouxe consigo inúmeras falências de empresas com um desemprego galopante, o aumento assustador da dívida pública, e ainda a questão do humilhante Ultimato enviado a Portugal pela Inglaterra, em 11 de Janeiro de 1890.

O Partido Republicano, interessado em derrubar a monarquia, e já presente em todo o país através de comissões políticas municipais e paroquiais organizadas, apoiava-se cada vez mais nas forças da Maçonaria e, no início do século XX, na famosa e terrível Carbonária, sociedade secreta com grande influência nas massas populares, presente e actuante nas cidades e na província, e treinada e disponível para usar a violência, o enxovalho e o insulto, a qualquer hora e em qualquer circunstância.

Provavelmente, eram elementos da Carbonária e instigados por essa organização, os dois homens que, em 1 de Fevereiro de 1908, com o objectivo de matar a monarquia mais depressa e com menos dificuldade, mataram o rei D. Carlos e o filho herdeiro do trono, no Terreiro do Paço, quando regressavam de Vila Viçosa.

O Partido Republicano, por seu lado, foi tentando assumir o poder ou minar o mesmo poder apresentando-se às eleições locais e nacionais que iam acontecendo, e muitos êxitos alcançou. No Círculo de Lisboa, já tinha a maioria na Câmara.

Por esse caminho porém a viagem era longa, morosa e complicada, e o objectivo talvez inatingível.

Só a revolução. Tinha que fazer-se uma revolução.

Uma primeira tentativa para derrubar a monarquia, levada a cabo por sargentos e cabos das guarnições militares do Porto, em 31 de Janeiro de 1891, na sequência do Ultimato e da revolta geral que o mesmo criou entre o povo, de norte a sul, foi esmagada ao cabo de duas horas pelas baterias da Serra do Pilar e pelas forças da Guarda Municipal da cidade, postadas ao cimo da rua de S. António. [6]

A tentativa definitiva viria a ter início na capital pela meia-noite de 3 para 4 de Outubro de 1910, quando sua majestade o rei D. Manuel II jogava uma partida de bridge com o presidente da República do Brasil, de visita a Portugal.

Organizado pela Carbonária - os caceteiros da maçonaria - apoiado pelo Directório do Partido Republicano e contando com as figuras então mais gratas às massas populares da capital, o movimento durou cerca de 19 horas, e esteve em risco de abortar. O chefe principal do movimento, o almirante Cândido dos Reis, convicto do desastre, suicidou-se com um tiro de pistola. Algumas forças acampadas na Rotunda, ao cimo da Avenida da Liberdade, chegaram a desertar. Só ficou o comissário naval Machado dos Santos a comandar uns duzentos homens, civis e militares que, barricados, aí aguentaram mais tempo e, no meio de enorme confusão e de grandes manifestações populares, acabaram por vencer.

Ao tempo, com exagero certamente, alguns como Guerra Junqueiro, chamaram à revolução um “milagre,” e outros, como Gomes da Costa, apelidaram-no de “bambúrrio”, ou seja, um golpe de sorte ou de magia.

Disse o primeiro: “Fez-se o milagre da Rotunda. Milagre que eu comparo aos de Lurdes. Ali vedes um paralítico erguer-se de repente: salvou-o a fé em Nossa Senhora de Lurdes. Aqui, um povo paralítico há trinta séculos, ergueu-se poderoso, porque tinha fé em Nossa Senhora da Liberdade ou da Pátria”.

Escreveu o segundo: “Vejam a Revolução. Que foi? Uma fuga; uma debandada! Fugiu tudo! Fugiram monárquicos, fugiram republicanos, fugiram todos…[7]

A verdade é que, pelas 9 horas da manhã do dia cinco, no meio de gritos e ovações e ao som de várias bandas musicais que circulavam pelas ruas da Baixa a tocar a “Marselhesa”e a “Portuguesa”, a um mar de gente apinhada no Largo do Pelourinho, numa das janelas da Câmara, anunciou José Relvas a instauração da República

Esta fora uma revolução essencialmente popular. Enquanto as demais revoluções portuguesas tiveram como actores altas patentes das forças armadas, esta foi o povo que a organizou e foi o povo que a salvou, com o contributo e a ajuda natural de umas centenas de sargentos e praças do exército e da marinha sedeados na capital.

Uma revolução dá-se apenas num lugar. Neste caso, na capital. E a província? Como chegar à província?

Conta Raul Brandão que João Chagas, durante o último ministério da monarquia, lhe dissera a esse propósito: Que me importa a província? Que me importa mesmo o Porto? A República, fazemo-la nós depois pelo telégrafo.

E assim foi.

Seis minutos depois da sua proclamação, o novo governador de Lisboa, Eusébio Leão, telegrafou para todas as vilas e cidades do país, enviando a seguinte mensagem:

Administradores do Concelho do continente.

Sirva-se arvorar bandeira republicana e aguardar ordens. Comunique à Câmara e mais repartições públicas para devido cumprimento.

Governador Civil de Lisboa, Eusébio Leão.

Em Resende, havia telégrafo desde 1888. Funcionava então numa casa particular, à beira do edifício da Câmara e hoje o Quartel da GNR, do outro lado da rua. [8]

Foi através desse telégrafo que chegou a Resende o referido texto vindo de Lisboa a dar conhecimento do que acontecera.

Era então Administrador do Concelho, como representante do governo central, o advogado Dr. João de Miranda Mendes, natural de Freigil mas com ascendência de S. Cruz do Douro e casado na Casa do Choupal, em S. Martinho de Mouros., e era presidente da Câmara o senhor José Cardoso Vieira.

Como é habitual em momentos como este, foi necessário mudar os rostos da equipa camarária, depondo os que estavam e substituindo-os por pessoas mais afectas ao regime entretanto instaurado.

Em obediência a um decreto emanado do Ministério do Interior da República, logo em 11 de Outubro, tomou posse da gestão da Câmara uma nova Comissão Municipal, constituída pelos seguintes munícipes: o Dr. João Canavarro Chrispiniano da Fonseca, de Barrô, que assumiu a presidência; Aquilino Borges Carneiro, das Cotas, que ficou como vice-presidente; e os Dr. Joaquim José Loureiro Dias, Dr. Manuel Joaquim Esteves e Joaquim Anthero Cardoso Vieira, na qualidade de. Vogais.

Nessa reunião de tomada de posse, foi lida por um membro da comissão a seguinte proclamação:

Concidadãos! Está finalmente libertada a glorioza Pátria Portuguesa! Depois de um longuíssimo período de verdadeira e violenta opressão, raiou enfim a aurora luminosa da liberdade![9]

Uma semana depois, para celebrar a instauração da República, a Câmara decidiu na sua reunião “iluminar a sede da comarca”.

Em 27 de Outubro, por incompatibilidade com o novo regime, foram substituídos o administrador do concelho e o vereador Dr. Joaquim José Loureiro Dias.

Tendo entretanto o Dr. João Chrispiniano sido nomeado director da Casa de Correcção de Vila do Conde, foi substituído em 3 de Novembro na presidência da Câmara pelo Dr. António Aurélio Monteiro de Araújo, um jovem advogado com residência em Minhães, na Casa de Aldeia de Baixo, que se manteve em funções até 30 de Novembro de 1911, sendo então substituído pelo Dr. Manuel Rebelo Moniz, nascido em Ponta Delgada e casado na Quinta do Monte, em Anreade.

O Dr. Rebelo Moniz manteve-se em funções até 1920 e, mais tarde, de novo, de 1927 a 1942, perfazendo 24 anos de mandato à frente da Câmara.

O Governo Provisório da República, entretanto, decidiu coisas tão boas como a liberdade de imprensa, o horário de trabalho, o dia de descanso semanal obrigatório e o direito à greve; criou o ensino pré-primário; estabeleceu o ensino obrigatório para todas as crianças dos 7 aos 11 anos; fomentou maior igualdade entre o homem e a mulher nos seus direitos; e instituiu o registo civil obrigatório de nascimentos, casamentos e óbitos, que até então não existia, e que fora sempre um cuidado exclusivo e benemérito da igreja em Portugal. [10]

A este propósito, não posso deixar de referir que o governo republicano, cometendo um crime inqualificável, extorquiu todos os livros de assentos de Baptismos, Casamentos e Óbitos que existiam nos nossos arquivos paroquiais, fruto do trabalho cuidadoso de muitas gerações de sacerdotes que passaram pelas paróquias, ao longo de quatro séculos, para os fazer seus e os guardar nos arquivos distritais, o mesmo acontecendo aos livros e documentos dos ricos arquivos da Sés e dos Paços Episcopais que foram depositados no Arquivo da Torre do Tombo e na Biblioteca Nacional.

Isto foi muito doloroso para os párocos e para as paróquias: sem apelo nem agravo, extorquiram-lhes todos os livros que continham a história demográfica das suas famílias e das suas freguesias.

Formado em maioria por maçons, eivado de um anticlericalismo doentio e ansioso por laicizar a vida pública, depressa começou também o governo a tomar outras medidas humilhantes e insultuosas contra a Igreja, que me dispenso de enumerar por me escassear o tempo e para não ser fastidioso.

Não contente com isso, em 11 de Abril de 1911, publicou a Lei da Separação do Estado das Igrejas, redigida pelo maçon Afonso Costa, que então exercia funções no governo como Ministro do Interior.

Em consequência dessa lei, a hierarquia eclesiástica deixava de ser reconhecida e respeitada, substituindo-se ao poder eclesiástico o poder civil, e tomando este último o controle quase absoluto da vida e da organização da Igreja.

Pretendia-se laicizar o Estado, e bem. O Estado não tem que ser confessional. Nunca o devia ter sido.

Se a Lei da Separação tivesse sido apenas e verdadeiramente uma Lei de Separação, com respeito mútuo pela missão e função das duas partes, como se verifica actualmente, teria sido para a Igreja Católica o melhor presente de todos os tempos. Tal separação, desejada há muito por amplas camadas da Igreja, pelo menos desde 1904, [11] só podia ser benéfica para todos: uma Igreja protegida, subjugada ou instalada perde o seu dinamismo e torna-se tíbia, medíocre e preguiçosa. A Igreja sempre ficou prejudicada na sua acção de evangelizar e promover as pessoas quando esteve junta, casada ou amancebada com a política e com o poder.

O que se pretendia porém era controlar a Igreja, desligá-la de Roma, retirar-lhe toda a influência na sociedade, calar a sua voz, torná-la dependente do governo e subjugada ao poder político. E aí é que nasceu a chamada “questão religiosa” que tão prejudicial se veio a tornar depois para a própria República.

Na linha do que já tinha ocorrido nos tempos do liberalismo com as Ordens Religiosas, especialmente em 1834, a Igreja viu-se privada por esta lei de personalidade jurídica e foi expropriada da maior parte dos seus bens incluindo agora os seminários, as igrejas, os santuários e as capelas, e ainda as residências e os passais dos párocos, cabendo às comissões concelhias fazer o arrolamento e a inventariação desses bens. [12]

Em simultâneo, e para além de outras medidas ofensivas à Igreja e à liberdade religiosa, estabelecia-se a criação das chamadas “cultuais” – organismos laicos constituídos em maioria por maçons e livres-pensadores locais, afectos ao regime, encarregados de gerir os bens das igrejas e o exercício do culto, nomeadamente o toque dos sinos e o horário das Missas e das Procissões, que só podiam concretizar-se no interior dos templos – ficando expressamente excluídos de fazer parte delas os sacerdotes. Para substituir as côngruas paroquiais para as quais contribuíam os fiéis católicos, então foram abolidas pelo governo, estabeleceu-se um sistema de “pensões” a pagar pelo Estado “aos ministros da Religião Católica” que as requeressem.[13]

Para levar a lei à prática, para além de um rede complicada de comissões distritais e concelhias, difíceis de constituir e de coordenar, criou-se a chamada “Comissão Central de Execução da Lei de Separação”,[14] e uma “Comissão Nacional de Pensões Eclesiásticas”, dependentes do Ministério da Justiça.

Resende não era excepção, logicamente, e foram então as nossas paróquias todas espoliadas das igrejas e capelas e também dos passais e das residências dos párocos. Tudo foi devidamente arrolado e inventariado por comissões locais às ordens do governo e tudo ficou a pertencer ao Estado. Passais e residências dos párocos foram todas vendidas depois em hasta pública pela melhor oferta, revertendo todo o lucro para os cofres do Estado, e as igrejas e capelas foram cedidas gratuitamente aos sacerdotes e ao povo que o requeressem, para aí celebrarem o culto religioso que desejassem.

As igrejas e capelas vieram a ser devolvidas às paróquias mais tarde, já em 1940, com Lei da Concordata entre o Estado Português e a Santa Sé. Ao contrário, as residências e os passais acabaram por ficar para sempre na posse de quem as adquiriu nos ditos leilões realizados na sede do distrito. Exceptuam-se os passais e as residências de Freigil, de Cárquere e de S. Martinho de Mouros que, tendo sido arrematadas por particulares, foram depois generosamente entregues pelos mesmos às paróquias.

Quanto aos párocos do concelho, sem qualquer fonte de subsistência (o governo tinha-lhes retirado a côngrua e os passais para se verem na necessidade de aceitar a tal pensão do Estado e assim ficarem dependentes dele), permaneceram firmes no seu posto e, dos 15 que então havia, só um aceitou a tal pensão do governo. [15]

Outro facto digno de nota é que, por informação de professores que eu ainda conheci, quando os professores do país receberam ordens para retirarem os crucifixos das escolas e não fazerem mais qualquer referência à Fé ou à Religião no exercício do seu múnus, nenhum professor de Resende obedeceu, mesmo sabendo que ficava em risco a sua própria subsistência. Honra lhes seja!

Quando, em 1914, a Comissão Central de Aplicação da Lei da Separação enviou a todas as Câmaras do país um minucioso questionário sobre o modo como estava a ser aplicada a mesma lei e sobre as reacções das populações sobre o assunto, o nosso presidente da Comissão Executiva da Câmara, Rebelo Moniz e o nosso administrador do concelho Aquilino Borges Carneiro, ao contrário de outros, foram notavelmente correctos e respeitadores.

Rebelo Moniz, mais claro e expressivo nas respostas, à pergunta sobre a qualidade da Lei da Separação, respondeu:

A intransigência demagógica tem sido a maior calamidade para a República.

Quando o questionaram sobre a reacção do povo, em relação à Lei, disse:

É geral o protesto, e maior seria se não houvesse moderação na aplicação da lei.

Sobre o aumento ou a diminuição da fé e da prática religiosa do povo, na sequência dessa lei, declarou:

Aumentou como não há memória. Assim lavram os católicos o seu protesto.

Quando, no último ponto do questionário, lhe pediram o para dar o seu parecer pessoal sobre a lei, escreveu:

Este quadro cor-de-rosa (que acima referi) deve-se exclusivamente à prudência e ao tacto administrativo das autoridades e individualidades políticas que nos primeiros anos da República preponderaram no concelho. Legitimamente se foi aplicando a lei em tudo o que não pudesse levantar o protesto popular nem escravizar a consciência dos crentes. Na revisão (da lei), devia-se atender às constantes e conhecidas reclamações do povo português, se querem que um dia ele sirva a República. [16]

Este é um assunto de grande interesse que eu irei apresentar em Lisboa, na próxima Primavera, em assembleia-geral da Academia Portuguesa de História, com um ângulo mais alargado e profundo, a focalizar todo o distrito de Viseu.

Nesse mesmo ano de 1914, começou a 1ª Grande Guerra. A Alemanha, a Turquia, a Bulgária e a Áustria-Hungria de um lado, e a França, a Sérvia, a Inglaterra e a Itália do outro, envolveram-se num enorme conflito que flagelou e dizimou a Europa durante quatro anos.

Aliados da Inglaterra e vendo-nos na necessidade de defender as nossas colónias africanas disputadas há muito pela Alemanha e pela Inglaterra, acabamos por ter de nos envolver também na Guerra, dois anos depois, ao lado da Inglaterra e da França. Os soldados portugueses foram enviados para Angola e Moçambique, primeiro, e mais tarde para França, e, apesar de mal armados e mal alimentados, deram provas de especial bravura e enorme coragem em todas as circunstâncias.

De Resende, era o capitão Nunes da Ponte, filho do médico Nunes da Ponte que era natural dos Açores, e que tem aqui na vila uma rua com o seu nome. O filho, esteve em Moçambique envolvido nas operações militares de 1918.

No Corpo Expedicionário Português, através do Regimento de Infantaria nº 9 de Lamego, seguiram muitos rapazes de Resende para França, onde lutaram como verdadeiros heróis. A maior parte regressou e ainda conhecemos alguns deles, mas oito perderam a vida nas trincheiras e nos campos de batalha e os seus corpos ficaram sepultados nos cemitérios de França: quatro de Resende, três de Barrô e um de Anreade. Na mesma altura, morreram de pneumónica, em África, onde se encontravam ao serviço da pátria, mais três soldados do concelho: um de Anreade, um de Barrô e outro cuja freguesia não consegui identificar. [17] Julgo que, ao contrário de muitas outras terras, Resende nunca lhes rendeu a homenagem que eles mereciam.

Andavam os soldados na Guerra, o país estava arruinado economicamente, o povo andava magoado, descorçoado e sem esperança, quando, de 13 de Maio a 13 de Outubro de 1917, apareceu Nossa Senhora a três miúdos na Cova da Iria, em Fátima, pedindo a conversão e a oração de todos para que se renovasse o país e o mundo, para que acabasse a guerra e os soldados voltassem para casa.

Rezem o terço todos os dias para alcançarem a paz e o fim da Guerra![18]- disse Nossa Senhora em 13 de Maio.

Se fizerem o que eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz! A Guerra vai acabar, mas, se não deixarem de ofender a Deus, começará outra pior. Quando virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai punir o mundo dos seus crimes por meio da guerra, da fome e da perseguição à Igreja e ao Santo Padre! – avisou no mês de Julho.[19]

A Guerra vai acabar e os militares voltarão em breve para as suas casas. – afirmou a Virgem em 13 de Outubro.[20]

O fenómeno das aparições foi então muito mal visto pelas autoridades, eivadas de descrença e interessadas em minimizar a Igreja e em destruir a fé em Portugal. Na noite de 23 de Outubro de 1917, os carbonários de Santarém foram a Fátima e cortaram o tronco da azinheira onde Nossa Senhora aparecera. A primeira capelinha das aparições, foi dinamitada em 6 de Março de 1922. Os miúdos, por ordens vindas de Lisboa, chegaram a ser presos, interrogados e ameaçados pelo Administrador de Ourém, por terem inventado uma “mentira” tão grande.

Entre parêntesis, lembrarei que ainda hoje há alguns historiadores que acusam a Igreja, então em dificuldades, de ter inventado as aparições de Fátima para atrair de novo as multidões à Fé e à prática religiosa, o que não tem cabimento. Pergunto: Crianças tão pequenas, analfabetas, tímidas e aldeãs, interrogadas nessa mesma hora por pessoas insuspeitas (jornalistas do Século, por exemplo), eram capazes de inventar coisas tão sérias, dizer informações doutrinalmente tão seguras, prever o fim duma guerra tão grande e anunciar o princípio de outra que só viria a acontecer vinte anos mais tarde?

A verdade é que as palavras dos miúdos estavam certas: a Primeira Grande Guerra acabou no ano seguinte; uma rara e estranha “aurora boreal” - o sinal anunciado por Nossa Senhora - aconteceu na noite de 25 para 26 de Janeiro de 1938; e a Segunda Grande Guerra, que dizimou a maior parte da Europa, começou em 1 de Setembro de 1939.

A minha queria mãe, que observou o tal sinal, contava-nos que um certo dia, ao anoitecer, o sol ficou vermelho, aos poucos todo o firmamento ficou em chamas de lume, parecendo que tudo iria arder, e que as pessoas, pensando que era o fim do mundo, apertavam as mãos na cabeça, gritavam por socorro e corriam para as igrejas e capelas a rezar e a pedir perdão dos seus pecados.

O ano de 1918, para além de ser o ano em que a Primeira Grande Guerra terminou, no mês de Novembro, ficou marcado na história por outros importantes motivos.

O primeiro foi a “gripe pneumónica” também conhecida por “peste espanhola”: uma enorme epidemia que atingiu o país de norte a sul, matando famílias inteiras e causando o pânico por toda a parte. Entre 1918 e 1919 morreram da peste no país 102.750 habitantes. Em Resende, só no ano de 1918, faleceram 839 pessoas, quando, em anos normais, o número de óbitos não ultrapassava as 400. Meus pais diziam que, no mesmo funeral, chegavam a ir 4 e 5 pessoas a enterrar e que houve casas que ficaram sem ninguém.

O caso foi tão complicado que, ainda hoje, a recordá-lo, se encontra no átrio do Hospital de S. António, no Porto, uma lista enorme de médicos e enfermeiros que morreram também nessa época, infectados pelos doentes que tratavam.

Outro facto importante ocorrido em 1918 foi a restauração da monarquia no norte do país.

Como reacção ao assassínio do presidente da República, Sidónio Pais, na estação do Rossio, em 14 de Dezembro desse ano, quando ele se preparava para viajar de comboio para o Porto, e na tentativa de acabar com os males de que a República e o país sofriam, as guarnições militares do Porto pegaram em armas e, no dia 19 de Janeiro do ano seguinte, instauraram de novo a monarquia, conseguindo em pouco tempo controlar toda a região do norte do país, excepto a vila de Chaves. A Junta Governativa do Reino que então se constituiu, presidida por Paiva Couceiro, tentou organizar política, militar e administrativamente todo o território que lhe obedecia, inclusivamente nomeando governadores civis para todos os distritos de Viana até Coimbra, e revogou toda a legislação promulgada em 5 de Outubro de 1910.

Seguiu-se então uma guerra civil entre os que procuravam impor a monarquia e os que tentavam defender a república.

Foi nesta fase, que ficou conhecida por “Monarquia do Norte”, que se tornou famoso mais um resendense, natural de Anreade, o Eng.º Alberto Teixeira dos Santos.

Segundo consta, pôs ao dispor dos monárquicos os seus conhecimentos de engenharia e, com a ajuda dos amigos da monarquia nesta nossa região do sul do Douro, dinamitou a Ponte de Mosteirô, no início de Fevereiro desse ano, para tentar impedir o progresso das forças republicanas que avançavam para o norte, vindas de Lisboa e do sul. [21]

Consta também que, nessa mesma altura, um grupo de habitantes de Felgueiras proclamou solenemente a restauração da monarquia, conseguindo rapidamente a adesão da maioria da população. O líder do grupo, Manuel de Almeida, pai do nosso saudoso Pe. Dr. Albino de Almeida Matos, obrigou uma sua irmã que estava com gripe a erguer-se da cama para lhe bordar com toda a urgência uma bandeira da monarquia e percorreu a aldeia toda dando vivas à Monarquia restaurada, com a oposição revoltada de um seu conterrâneo vindo do Porto que, sendo republicano, não tirou o seu chapéu à monarquia e esteve à beira de provocar um incidente de grandes proporções.

Minhas senhoras e meus senhores, essa bandeira ainda existe. Pena tenho de que não seja possível apresentá-la hoje aqui, como esperava, por se encontrar em Coimbra, na casa das dedicadas irmãs do senhor Pe. Dr. Albino Matos.

O reino da monarquia foi porém muito fugaz. As forças republicanas, depois de repetidas escaramuças, acabaram por entrar no Porto, logo em 13 de Fevereiro, e restauraram a República e a Constituição de 1911.

Tanto o nosso engenheiro de Palma como os monárquicos de Felgueiras passaram então um mau bocado. Conhecida a sua intervenção, os republicanos andaram no seu encalço, tentando prendê-los e aplicar-lhe o”castigo” que ele mereciam.

Uns e outros andaram fugidos de suas casas, com receio do pior.

Em relação ao Engº de Palma, conta-se que, durante muito tempo, o homem saía de manhã de casa, antes de aclarar o dia, refugiava-se nas minas das cercanias e numa furna da Alagunta, perto de S. Romão, e só regressava a Palma, depois de escurecer por completo. Consta ainda que um seu irmão, que o ajudou na operação da ponte, se fora esconder numa loja de gado em S. Romão, no lugar de Garrafola.

Querido ouvintes

Da Primeira República, podemos dizer hoje que não foi muito mais que um sonho e um abrir de horizontes. Um sonho de liberdade e de democracia que depressa se esvaiu em desilusão e descrédito; mas um abrir de horizontes que viria a deixar entrar de novo o sol, 64 anos mais tarde.

Efectivamente, em toda a Primeira República, os problemas do país, que já vinham da monarquia, continuaram e agudizaram-se ainda mais: os partidos políticos guerreavam-se ferozmente; as lutas pelo poder eram encarniçadas e constantes; o parlamento punha e depunha os governos com contínuas moções de censura, não lhes dando tempo para legislar e governar: em 16 anos de regime tivemos 45 governos e 8 presidentes de república, o que dá, em relação aos governos, uma média de 3 a 4 meses de gestão para cada um; a corrupção dos políticos era uma doença considerada incurável; as greves sucediam-se umas às outras como rajadas de vento, a abanar e a destruir a economia do país: só no ano de 1911, 247; a má governação, os maus anos agrícolas e as despesas com a Guerra lançaram o país na bancarrota e na fome; a dívida pública aumentava sempre mais; a moeda desvalorizava-se; o crédito internacional era cada vez mais difícil; os juros dos empréstimos ao país subiam assustadoramente; a insegurança nas ruas era cada vez mais insustentável; os atentados à bomba e os assassinatos na rua traduziam uma enorme agitação social; a carestia de vida não parava de crescer; e a emigração de portugueses para o Brasil era uma verdadeira “sangria nacional”: só em 1813, saíram 67 mil concidadãos.

No meio disto, Resende não era excepção. Havia muito analfabetismo e passou-se muita fome por aqui. Quando a República se impôs, o drama do analfabetismo atingia em Resende 80% dos nossos conterrâneos. A população, que rondava então as 20.000 pessoas (quase o dobro da população actual) vivia exclusivamente do que a terra produzia. Não havia qualquer subsídio ou apoio do Estado às crianças, aos pobres, aos doentes ou aos idosos. Muitos tiveram de emigrar para o Brasil, tentando fugir à pobreza.

A tudo isto, em Resende e no país, acrescia ainda um descontentamento geral, pela forma como a República tratava a Igreja e a Religião.

O insuspeito historiador Fernando Rosas, deputado do Bloco de Esquerda, dizia há dias, em Fátima, que os maus-tratos que a República deu à Igreja, foram a causa principal da sua perdição. [22]

Estava o ambiente mais que preparado para que alguém, contando com o apoio da maior parte da população, tomasse conta do poder e pusesse ordem no país. Foi o que aconteceu em 28 de Maio de 1926. Um movimento militar saído de Braga sob a direcção do general Gomes da Costa, apoiado aos poucos pelos demais quartéis do país, tomou conta do poder e propiciou o aparecimento do estado autoritário que se designou por Estado Novo, que só veio a ser derrubado em 25 de Abril de 1974.

Vamos concluir

Resende, ao longo dos 16 anos da Primeira República, não recebeu nenhum benefício que se conheça. Apenas dificuldades, doenças e misérias.

Efectivamente, a estrada nacional nº 37 (hoje 222) já estava no ribeiro do Paço no início do século.

A sua continuação até S. Gens só veio a acontecer em 1926, já depois do 28 de Maio, tendo sido para o efeito apeada a Capela de S. Gens que dava o nome ao lugar, e substituída pela actual da Senhora da Livração.

Foi porém durante o Estado Novo, já no 2º mandato de Rebelo Moniz, mais concretamente em 1828, que o nome do povoado de S. Gens se mudou para “Vila de Resende”, se criou o brasão com as armas do concelho, e se deu início a um período de grandes obras que ainda hoje emolduram a nossa sede municipal: a continuação da estrada para Caldas de Aregos, o edifício dos Paços do Concelho e a electricidade a S. Martinho de Mouros; o Jardim Municipal e o abastecimento de água à Vila; o Hospital da Misericórdia e a Avenida D. Afonso Henriques; o Patronato D. Maria Rosa Soares da Silva; e a construção dos edifícios das Escolas Primárias de Resende e de S. Martinho que agora foram substituídos pelos novos Centros Escolares.

Conclusão:

Na Primeira República, Resende teve muita democracia e poucos benefícios. Durante o Estado Novo, não teve democracia mas recebeu assinaláveis benefícios. A Terceira República, a que agora vivemos, tem vindo a dar-nos, até ao momento, uma coisa e a outra: liberdade e progresso, democracia, e muitas e grandes obras.

Que seja sempre assim.

Termino, saudando esta feliz iniciativa do Rotary Clube, desejando longa vida e grandes êxitos à nossa primeira “Universidade”, e ambicionando as maiores e as melhores felicidades aos seus mestres e aos seus alunos.

Bem hajam por me terem ouvido.

*Conferência proferida pelo Dr. Joaquim Correia Duarte na Sessão Solene de Abertura da "Universidade Sénior"em Resende, em 9 de Outubro de 2010



[1] ---Herculano, Alexandre – O Bobo, Biblioteca Ulisseia, Lisboa, p. 46

[2] --Duarte, J. Correia – Resende na vida e na obra de Eça de Queiroz, Ed. da Câmara Municipal, 1996, pág. 9 (esgotado)

[3] --Herculano, Alexandre – Idem, idem

[4] ---Nogueira, José Félix Henriques Estudos sobre a Reforma em Portugal, Lisboa, Typographia Social, 1851, pág. IX-X

[5] ---Teles, Basílio –Do Ultimatum ao 31 de Janeiro, pág. 101

[6] ---Parece que o famoso “Fado do 31” que mais tarde Rodrigo cantou e imortalizou, tem relação com o que aconteceu nesse dia no Porto, mais propriamente junto do Café da Brasileira. Eis parte do texto: “À porta da Brasileira, dois tipos encontram dois. Juntam-se os quatro, e depois, lá começa a cavaqueira. Agrava-se a chinfrineira…vai aumentando o zum- zum. Vai bum, arrebenta…pum! Depois, agora, vereis - vinte e quatro, vinte e seis - vinte e nove e trinta e um!

[7] ---Costa, Manuel Gomes da – Memórias, Clássica Editora, Lisboa, 1930, p. 146

[8] -Duarte, J. Correia – Resende e a sua História, Vol. I, Resende, 1994, pag. 479

[9] ---Livro de Actas da Câmara de Resende, 1910.

[10] ---Muitos párocos do país, desde tempos imemoriais, tiveram o cuidado de registar os baptismos, os casamentos e os óbitos dos seus paroquianos. A partir do século XVI, tal serviço foi tornado obrigatório pelos decretos do Concílio de Trento (1545-1563), e são esses assentos a única informação que temos se quisermos saber alguma coisa sobre os nossos ascendentes antes de 1911.

[11] ---O Papa Leão XIII (1878-1903) aconselhara a Igreja a praticar a chamada política de “ralliement”, ou seja, a conveniência de a Igreja colaborar com o regime instituído no seu país.

[12] ---Lei da Separação, Cap. IV, artº 62

[13] ---Idem, Cap. II, artº 17

[14] --Nomeada por Portaria de 18.05.1911 ( Diário do Governo nº 116, de 19/05)

[15] ---Resposta do Presidente da Câmara e do Administrador do Concelho ao Questionário enviado em 1914 pela Comissão Central de Aplicação da Lei da Separação.

[16] --- Respostas ao “Questionário sobre a Lei da Separação” (Lamego e Viseu), anexas ao ofício nº 69 do Governo Civil de Viseu, de 16 de Março de 1914, in ACMF- Arquivo -CJBC-INQUE-VIS., fls. 27 e 28

[17] ---Livros de Assentos de Óbitos da Conservatória do Registo Civil de Resende.

[18] ---Aparição de 13 de Maio de 1917, segundo o testemunho da Irmã Lúcia.

[19] ---Aparição de 13 de Julho de 1917.

[20] ---Aparição de 13 de Outubro de 1917, minutos antes do famoso “milagre do sol”

[21] ---Esta informação chegou-me apenas por via oral. Há quem diga que Teixeira dos Santos – o Engenheiro de Palma – apenas teria fornecido aos defensores da monarquia as técnicas e os conhecimentos necessários para dinamitarem a ponte.

NOTA: A ponte de Mosteirô fora inaugurada em 1889 , veio depois a ser recuperada em 1927, e totalmente transformada em 1973 quando subiram as águas da Barragem de Carrapatelo, para permitir a passagem aos barcos no rio.

[22] ---Jornadas Nacionais das Comunicações Sociais, Fátima, 23 e 24 de Setembro. Textualmente: “ A questão religiosa precipitou o fim da I República”…foi um erro mortal e imperdoável, fatal para a República iniciada em 1910”

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