quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Revista do Agrupamento de Escolas de Resende

Saiu o 1.º número desta interessante revista, que tem ao leme Paulo Sequeira, Fernando Vieira e Sérgio Matos, estando aberta à colaboração de todos os elementos da comunidade educativa.
Pode ser lida a partir daqui.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Ao almoço, no restaurante "Gentleman", com Horácio Saraiva, presidente da Junta da Panchorra*

“Ele é integralmente um gentleman”
Esta citação de Rebeca West, escrita na parede à direita, logo à entrada do restaurante, define e caracteriza o ambiente acolhedor, a arte de bem receber, o bom gosto e a qualidade da comida. Este novo Gentleman, capitaneado por Manuel Pedro Gomes, de decoração sóbria e de muito bom gosto, corporiza o conceito abrangente de restauração: pratos regionais, refeições para dias especiais, almoços muito económicos de preço fixo, pizas, massas e menus infantis, de entre outros destaques. Com bom tempo, poder-se-á desfrutar do espaço convidativo da esplanada. Algumas informações úteis encontram-se no site www.o-gentleman.pt
É um óptimo espaço para quem quiser fazer da refeição um agradável encontro de conversa, como aconteceu com Horácio Saraiva.


Quem é o Presidente da Junta da Freguesia da Panchorra
Horácio Saraiva nasceu a 31 de Janeiro de 1971, na Panchorra. Frequentou a antiga escola primária da Panchorra, tendo aqui feito também o 5.º e 6.º anos no âmbito da telescola. Após ter terminado o 7.º ano na Escola Secundária D. Egas Moniz, transferiu-se para o Externato D. Afonso Henriques, que frequentou do 7.º ao 11.º ano. O 12.º ano foi feito na Escola Secundária D. Egas Moniz. Cumpriu o serviço militar no Porto e em Santa Margarida.
O pai faleceu em Setembro do ano passado. A mãe vive na Panchorra. Tem uma irmã mais nova que vive em Lisboa
Trabalha nos serviços administrativos da Santa Casa da Misericórdia de Resende, onde também trabalha a esposa, e vive na vila. Tem um filho de 4 anos.
Pertence à comissão fabriqueira da paróquia da Panchorra, onde tem colaborado com o pároco na administração das situações correntes e na angariação de fundos para reparações da igreja e outras despesas do âmbito das actividades religiosas.
É o presidente da AFOPADIS (Associação para a Formação Profissional e Desenvolvimento de Resende), que é a entidade detentora da Escola Profissional de Resende.
É o presidente do Conselho de Compartes dos Baldios dos Povos da Talhada e da Panchorra, entidade responsável pela representação e gestão destes terrenos.
Gosta de futebol, tendo jogado durante vários anos pelo S. Martinho de Mouros, e ainda se reúne habitualmente com amigos para jogar umas partidas de futebol de cinco.
Actualmente, frequenta, à noite, o curso de Secretariado de Administração na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Lamego.
É Presidente da Junta de Freguesia desde 2009, em lista apoiada pelo PS, não tendo qualquer experiência autárquica anterior. A lista do PS obteve cinco mandatos para a Assembleia de Freguesia, tendo uma lista de independentes obtido dois. Anteriormente, a maioria na autarquia da Panchorra era afecta ao PSD.

O que fez e o que espera fazer pela Panchorra
Fez o levantamento do processo toponímico, dotando as ruas e caminhos da Panchorra e Talhada das respectivas placas de identificação.
Requalificou vários caminhos de acesso a terrenos agrícolas e a matos, possibilitando a circulação de tractores e de viaturas de bombeiros.
Calcetou várias ruas e caminhos da freguesia, tornando mais seguros e agradáveis os respectivos acessos.
Colaborou, através de uma parceria da Junta de Freguesia com uma entidade formadora, em acções de dupla certificação (profissional e escolar), o que permitiu que cerca de quinze pessoas obtivessem o 6.º ou o 9.º ano.
Tem organizado um passeio anual para toda a população da freguesia.
Como realização a curto prazo, tem projectada a construção de uma casa funerária, junto à igreja, estando esperançado que as obras comecem brevemente. É sua intenção também efectuar obras de requalificação no edifício da sede da Junta de Freguesia, de forma a criar aí uma valência de centro de dia para apoio aos mais idosos.
Convém referir que a sede da Junta tem um espaço internet, acessível através de dois computadores, que pode ser utilizado por todos os residentes. Estes têm também ao seu serviço uma impressora, um fax e uma fotocopiadora.

Respostas breves

1. Onde passou as últimas férias?
Em Nazaré

2. Compra preferencialmente português?
Não tenho preferência

3. Quais os seus passatempos?
Distraio-me com a prática de futebol e vejo televisão

4. Qual o momento mais feliz da vida?
O casamento e o nascimento do meu filho

5. E o mais triste?
O falecimento do meu pai

6. Que faz para ultrapassar as “neuras”?
Procuro afastar-me do problema

7. Qual o seu prato preferido?
Arroz de cabidela

8. Qual a obra mais necessária para o futuro do concelho de Resende que falta fazer?
A ligação à A24 (Bigorne)

9. O que mais admira nos outros?
A sinceridade, acima de tudo

10. O que mais detesta nos outros?
A falsidade e a hipocrisia

11. Qual é a festa que lhe dá mais gozo comemorar?
Até há poucos anos era a festa de S. Lourenço, o padroeiro da paróquia, que infelizmente se deixou de fazer. Agora é a festa da Labareda.


12. Quais os locais do concelho para onde costuma ir passear?
Caldas de Aregos e a serra de Montemuro

13. Tem algum objecto que guarda com particular predilecção?
Não

14. De que mais se orgulha?
De fazer bem aos outros

15. Quais as três obras mais importantes para o concelho feitas após o 25 de Abril?
Ponte da Ermida, a requalificação da vila de Resende e as piscinas cobertas

16. Acredita que a construção da estrada Resende/Bigorne irá arrancar brevemente?
Se dependesse exclusivamente da Câmara Municipal de Resende, sim. Mas não é este o caso e a situação não é favorável

17. O que é que acha que o Eng. António Borges irá fazer após a saída da Câmara Municipal?
Irá continuar a apoiar o desenvolvimento de Resende

18. Associa a palavra Resende a..?
Cerejas e cavacas

19. Já foi multado por infracção ao código da estrada?
Não

20. Concorda que o Estado limpe as matas de quem não o fizer e mande a conta?
Sim, já que as pessoas, ao não cuidarem daquilo que é seu, estão a prejudicar os bens dos outros

21. Que áreas deverão ser privilegiadas para criar emprego em Resende?
Dever-se-á investir sobretudo no turismo, em todas as áreas respeitantes a Caldas de Aregos, e no aproveitamento das potencialidades das cerejas, que não estão devidamente exploradas

22. Refira dois nomes que mais contribuíram para o desenvolvimento de Resende?
Eng. António Borges e Dr. Albino Brito de Matos

23. É favorável à redução de autarquias, designadamente de freguesias?
Concordo com a redução, mas tem de ir mais no sentido de isso ser feito nos centros urbanos. No interior é necessário ter em conta a proximidade às populações

24. Tem argumentos para fixar os mais novos na freguesia da Panchorra?
Não. Infelizmente não encontram lá trabalho

25. De que mais gostou deste “novo” Gentleman?
Fiquei agradavelmente surpreendido com tudo
*Apontamento de autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, Novembro de 2011

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Ao jantar, no restaurante "Gentleman", com Rui Rebelo, treinador do GD Resende*

“Ele é integralmente um gentleman”
Esta citação de Rebeca West, escrita na parede à direita, logo à entrada do restaurante, define e caracteriza o ambiente acolhedor, a arte de bem receber, o bom gosto e a qualidade da comida. Este novo Gentleman, capitaneado por Manuel Pedro Gomes, de decoração sóbria e de muito bom gosto, corporiza o conceito abrangente de restauração: pratos regionais, refeições para dias especiais, almoços muito económicos de preço fixo, pizas, massas e menus infantis, de entre outros destaques. Com bom tempo, poder-se-á desfrutar do espaço convidativo da esplanada. Algumas informações úteis encontram-se no site http://www.o-gentleman.pt/
Rui Rebelo, seguindo a sugestão do chefe, escolheu “bacalhau com broa”. Foram assim pedidas duas doses. O bacalhau, coberto de miolo de broa, foi acompanhado de batatas a murro e grelos, uma delícia para iniciar uma boa conversa, num gosto partilhado pelo “fiel amigo” e por Resende.


Quem é Rui Rebelo
Rui Miguel Rebelo nasceu em Lamego a 11 de Fevereiro de 1977. Os pais são naturais de Vinhós e encontravam-se à época a trabalhar em Lamego, tendo-se mudado para Resende em 1978, onde se estabeleceram por conta própria, fundando a “Ourivesaria Rebelo”, que ainda detêm. Rui Rebelo veio assim com um ano de idade para o nosso concelho, que só largou para estudar. Tem uma irmã mais nova, professora, que se encontra este ano a dar aulas na zona de Lisboa.
Todo o percurso escolar foi feito em Resende. Andou no jardim de infância na vila. Fez o 1.º e o 2.º anos na então escola primária de Vinhós e o 3.º e 4.º anos em Resende. Transitou para a então escola preparatória, onde concluiu o 2.º ciclo. Do 7.º ao 12.º anos frequentou a escola secundária Dom Egas Moniz.
Ingressou no Instituto Piaget de Viseu, onde concluiu, em 2001, a licenciatura em educação básica, variante de educação física. Em 2006, matriculou-se no mestrado “Desporto para crianças e jovens”, da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, que terminou em 2009.
É detentor dos seguintes cursos de treinadores: i) treinador Futsal, nível II (Basic-UEFA); e ii) treinador Futebol, nível II (Basic-UEFA), ambos promovidos pela Associação de Futebol de Viseu, organismo credenciado para o efeito.
Como professor, já passou por escolas de Alijó (um ano), Resende (três anos), Cinfães (um ano), novamente Resende (um ano) e Amarante (três anos). No ano lectivo transacto, ficou afecto ao Agrupamento de Escolas de Marco de Canavezes, o mesmo acontecendo este ano.
Vive na vila de Resende, é casado e tem uma filha.

Percurso como jogador e treinador
O seu gosto pela bola adveio-lho do pai, que chegou a ser jogador do Grupo Desportivo de Resende, com quem muito aprendeu. O treinador que mais o marcou foi Joaquim Alves, quando era jogador dos juvenis do Grupo Desportivo de Resende. Tinha espírito de liderança, sabia motivar e incutir um espírito de vencedor e preocupava-se em criar grupos coesos.
Começou por integrar as competições de desporto escolar desde muito novo. Jogou nos juvenis, juniores e seniores do Grupo Desportivo de Resende. Jogou também nos seniores do Sport Clube de Aregos e dos Unidos de Resende.
A sua primeira experiência como treinador ocorreu na época de 2001/2002, em que treinou os juvenis de Futsal do Sport Clube de Aregos e os juniores de futebol deste mesmo Clube. De 2004 a 2006, foi treinador dos seniores de Futsal de S. Martinho de Mouros. No ano seguinte, treinou os juniores da mesma modalidade neste clube. Em 2007/2008, jogou Futsal pelo S. Martinho de Mouros e foi co-responsável pela selecção distrital de Viseu de Futsal, o mesmo acontecendo até Novembro do ano seguinte.
A partir desta data, Novembro de 2008, começar a treinar a equipa sénior do Grupo Desportivo de Resende, funções de que viria a demitir-se em Fevereiro de 2010. Na época de 2010/2011, jogou Futsal pelo S. Martinho de Mouros e veio a fundar a Academia Futsal de Resende. Presentemente, é de novo o treinador dos seniores do Grupo Desportivo de Resende.


À frente do Grupo Desportivo de Resende
Rui Rebelo acabou de pegar numa equipa, que na época passada, em 26 jogos, sofreu 21 derrotas, empatou 4 vezes e só conseguiu uma vitória. O grande capital deste grupo de trabalho é a paixão por Resende, pois a maioria dos jogadores é natural do concelho e tudo fazem pelo seu engrandecimento. Sabem que o futebol pode ser um eficaz embaixador do nome de Resende. Embora com escassez de meios, tem a confiança e a disponibilidade da actual direcção do Grupo Desportivo de Resende . Todos os jogadores trabalham ou estudam, alguns bem longe do concelho, e por isso só treinam duas vezes por semana. Mas Rui Rebelo tem a capacidade de criar grande empatia e cumplicidade entre todos, transmitir confiança e cimentar elos de coesão, o que permite dar corpo a um projecto sustentado a médio prazo. É uma ambição que, de acordo com as suas palavras, só é possível alcançar com o trabalho e apoio de todos.


Respostas breves
1. Onde passou as últimas férias?
Em Albufeira

2. Compra preferencialmente português?
Tento fazê-lo

3. Quais os seus passatempos?
Prática de desporto e leituras técnicas ligadas ao futebol

4. Qual o momento mais feliz da vida?
O nascimento da minha filha

5. E o mais triste?
A morte de familiares

6. Que faz para ultrapassar as “neuras”?
Com um jogo ou treino de futebol ou uma corrida, passa tudo

7. Qual o seu prato preferido?
Frango estufado

8. Qual a obra mais necessária para o futuro do concelho de Resende que falta fazer?
Circuito de manutenção, que está a ser construído, segundo penso

9. O que mais admira nos outros?
A sinceridade

10. O que mais detesta nos outros?
A falsidade

11. Qual é a festa que lhe dá mais gozo comemorar?
A festa de aniversário da minha filha

12. Quais os locais do concelho para onde costuma ir passear?
Porto de Rei, Caldas de Aregos e monte de S. Cristóvão

13. Tem algum objecto que guarda com particular predilecção?
Não

14. De que mais se orgulha?
Da empatia e do bom clima que consigo criar entre os meus alunos e jogadores

15. Quais as três obras mais importantes para o concelho feitas após o 25 de Abril?


Ponte da Ermida, a construção da escola secundária e todas as importantes obras que se fizeram nos últimos anos

16. Acredita que a construção da estrada Resende/Bigorne irá arrancar brevemente?
Não, devido à grande crise financeira em que o país se encontra

17. Os resendenses têm acarinhado devidamente o Grupo Desportivo de Resende?
Não. Acho que podiam fazer mais para ter um clube de outra dimensão; o nosso concelho merecia mais

18. Associa a palavra Resende a..?
Paixão, família e amigos

19. Já foi multado por infracção ao código da estrada?
Já, por não ter o colete reflector

20. Concorda que o Estado limpe as matas de quem não o fizer e mande a conta?
As matas devem estar limpas; os militares podiam ajudar. Agora mandar a conta parece-me demais

21. Que áreas deverão ser privilegiadas para criar emprego em Resende?
As empresas industriais é que poderão criar muitos postos de trabalho, mas não estou a ver como em Resende. Deve-se apostar nas potencialidades turísticas

22. Refira dois nomes que mais contribuíram para o desenvolvimento de Resende?
Eng. António Borges e Dr. Albino Brito de Matos

23. Acha que a Câmara Municipal de Resende tem apoiado devidamente o desporto no concelho?
Sim, embora nalguns aspectos preferisse que fosse dada uma outra orientação a alguns apoios

24. Da sua experiência, nota diferenças nos alunos que praticam desporto?
Sim. São geralmente mais autónomos, disciplinados, aproveitam melhor o tempo e têm objectivos de vida

25. De que mais gostou deste novo Gentleman?
Da decoração, que acho original



*Apontamento da autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, número de Novembro de 2011

domingo, 23 de outubro de 2011

Aventura da entrada no Seminário de Tomar (Convento de Cristo) há 50 anos*

Tenho imenso prazer em fazer um relato da entrada no Seminário de Tomar, pela alegria que isso me trouxe. Eram tempos inimagináveis.

A vinda para o Seminário, com tudo o que isso representou, constituiu a maior aventura da minha vida. Foi algo que desejei e que até aos sete anos ocupou muito do meu imaginário. Os horizontes das maiores distâncias percorridas ficavam-se por Lamego, onde ia frequentemente, a pé, acompanhando o meu pai nas visitas a familiares, nas deslocações às feiras e nas idas à festa da Senhora dos Remédios, e por Sernancelhe, onde fui uma vez numa excursão do grupo da catequese em romaria à Senhora da Lapa, nunca tendo, pois, excedido os setenta quilómetros para além de Paus, a freguesia de Resende, onde nasci. O mundo para além desta distância era criado pela imaginação. E o que me cativava era a África e o mar desconhecidos. O mar era uma imensidão de água sem fim; a África era uma floresta contínua, habitada por animais selvagens, de grande porte, semeada de pequenas aldeias, de casas de colmo, junto a lagos e grandes rios. Foi por isso com emoção que, num dia de Julho de 1961, subi com o meu pai a serra das Meadas para ir ter com o então Padre Carlos, o chamado tio missionário, a Magueija, próximo de Lamego, onde me esperava para fazer o exame de admissão, o qual foi feito com um outro candidato. Efectuei a prova dando o meu melhor, pois era a chave da mudança de rumo da minha vida. Tive dúvidas acerca de um problema. Por isso, saí da prova adensado em dúvidas e interrogações sobre o meu futuro. Enquanto o meu pai falava com o Sr. Padre Carlos, dizia para comigo: “Será que vou passar? Terei hipóteses de entrar? E eu que podia ir para o Seminário de Resende, que o pároco da freguesia até tratava de ajudar a pagar as despesas...”. E depois culpava-me: “Quiseste ir para longe, para os Seminários onde já andam o Tomás, o Anselmo e o Vítor e às tantas não entras”. Estes pensamentos também me atormentavam, pelos efeitos devastadores na minha auto-imagem. Os meus irmãos eram considerados por toda a gente da freguesia alunos brilhantes “Os filhos do Alfredo Borges é que são espertos”, dizia-se. Se eu chumbasse, era o mundo que desabava. Mas num dia de Agosto, chegou a tão desejada e temida carta a Vinha Velha de Paus, que foi entregue pelo carteiro, o Sr. Miranda. Foi a medo que a abri. Mas era portadora de boas novas. Anunciava que tinha sido aprovada a minha entrada no Seminário de Tomar, indicando o dia em que nele deveria dar entrada.

Ficou combinado que iria com um soldado de Paus, que cumpria o serviço militar em Tomar. No dia aprazado, ou seja no dia 1 de Outubro, lá fui com alguns apetrechos enfiados numa bolsa de pano para a estação de Porto de Rei, na linha do Douro, acompanhado da minha mãe, do dito soldado e de uma senhora, que transportava uma mala (mais propriamente, uma caixa tosca de madeira) à cabeça, contendo a roupa, lençóis, cobertores e toalhas, que deveria ser despachada. A despedida não me custou. Afinal estava a realizar um sonho. Já não me recordo das emoções da viagem. Do que senti na mudança de comboio em Campanhã, no Entroncamento…., como me desenrasquei nas idas à casa de banho…, que conversas tive com o meu acompanhante militar (as indispensáveis, com certeza , que eu sempre fui de poucas palavras)...Tudo se apagou.

Cheguei a Tomar, era já tarde. O militar indicou-me a direcção do Convento e eu lá fui sozinho por aí acima. Chegado lá, fiquei todo baralhado, pois encontrei todas as portas fechadas. Olhei para todos os lados, mas não aparecia ninguém. E pensei: “é estranho, ao menos na minha terra está sempre gente a passar nos caminhos”. E avancei até encontrar gente. Na primeira casa que me apareceu, chamei a medo por alguém. Apareceu-me um senhor de meia idade que me informou como deveria fazer. Pelo modo como me falou fiquei sempre com a ideia de que não deveria simpatizar muito com padres, pois foi seco nas palavras, parecendo querer ver-se livre de mim. Na porta da entrada do Seminário, seguindo as instruções recebidas, toquei à sineta. Apareceu-me um padre a quem expliquei ao que vinha. Tudo isto aconteceu, porque cheguei um dia antes da data aprazada. Pouco depois, apareceu o meu primo, o Irmão José Ribeiro, que nunca mais me largou e me foi mostrando os cantos do grande casarão. Uma das primeiras coisas que lhe disse foi mais ou menos isto: “nestes corredores era capaz de passar uma “carreira”; e isto é tão grande que dava para todas as pessoas da nossa terra virem para cá morar”. Passado algum tempo, disse-me: “tu deves vir larado de fome”. E foi-me fazer umas sandes de queijo.

Vir de um meio pequeno e ser “despejado” de repente num convento gigantesco é obra. Ainda hoje me admiro da forma rápida como decorreu a minha adaptação. Como dormi sempre serenamente numa grande camarata, como me habituei a estudar numa grande sala, como me esforcei por cumprir regras exigentes e horários… Tudo num ambiente bem estruturado e previsível, mas sob o peso e a dimensão de corredores, claustros, escadas, janelas, abóbadas, naves…pouco consentâneos com o acolhimento e a vida quotidiana de crianças. E assim se passou o ano lectivo de 1961/62.

Já de novo em Tomar, gozadas as férias em Paus, e preparado para iniciar o segundo ano no Convento de Cristo, foi com enorme satisfação que recebi a notícia de que tinha sido um dos seleccionados para fazer esse ano em Valadares, mais propriamente em Vilar do Paraíso, com a missão de ocupar e dar vida às duas quintas, ligadas entre si, recentemente adquiridas pela Sociedade Missionária.

*Retirado do livro "Valadares-Seminário da Boa Nova: 50 anos/Lembranças dos primeiros tempos", coord. de Aires de Nascimento e editado pela ARM (Associação dos Antigos Alunos da Sociedade Missionária da Boa Nova)

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Ao café com …o Presidente da Junta de Feirão, José de Oliveira Monteiro*

Quem é o presidente da Junta da Freguesia de Feirão
José de Oliveira Monteiro nasceu em Feirão a 30 de Maio de 1971. Iniciou a aprendizagem das primeiras letras e números em França, onde frequentou a primeira e a segunda classes. De regresso a Feirão, aqui completou a terceira e quarta classes. O quinto e sexto anos foram feitos na antiga telescola de Feirão. De seguida, ingressou na Escola Emídio Navarro, em Viseu, onde terminou o 7.º ano. Desta escola transitou para a Escola Secundária D. Egas Moniz, em Resende, onde frequentou o 8.º ano, vindo a terminar o 9.º ano no Externato D. Afonso Henriques. Terminada a escolaridade, cumpriu o serviço militar em Abrantes e na Amadora, onde foi comando.
Relativamente à sua ida para França, convém referir que isso aconteceu quando tinha cerca de um ano, acompanhando os pais emigrantes, tendo regressado a Feirão com cerca de nove anos. O pai integrou-se razoavelmente bem nesse país, tendo sido motorista de pesados, mas a mãe nunca conseguiu desligar-se das origens e as saudades eram constantes, pelo que a família teve de refazer a vida em Feirão.
É solteiro e, tal como os pais, vive em Feirão.
O irmão vive em Carrazeda de Ansião, onde é engenheiro na respectiva Câmara Municipal. A irmã vive em Feirão, tendo um escritório de mediação de seguros em Castro Daire.
Após o cumprimento do serviço militar, José de Oliveira Monteiro trabalhou numa exploração agropecuária, destinada à produção de leite, pertença da família. Actualmente é angariador/mediador de seguros, tendo vários concelhos sob sua responsabilidade, cujas aldeias percorre diariamente, contactando as respectivas populações. Refere que tem facilidade em falar com as pessoas, sendo normalmente bem acolhido. Tem-se aplicado afincadamente naquilo que faz, achando que os resultados têm sido compensadores. Gostava que lhe fosse atribuído pelo seu responsável o concelho de Resende como uma das áreas de trabalho, esperando que isso aconteça brevemente.
Este é seu segundo mandato como Presidente da Junta, em lista apoiada pelo PSD, tendo vencido o seu opositor, apoiado pelo PS, por vinte e dois votos. No primeiro mandato não teve opositor. Sucedeu a seu pai como Presidente da Junta.
Refira-se que em Feirão, tal como acontece nas freguesias com 150 eleitores, ou menos, a eleição processa-se em plenário de cidadãos, sendo o voto secreto. Isto implica que formalmente as listas, compostas por três elementos que formarão a Junta de Freguesia, sejam apresentadas nesta reunião. Ao longo do ano, as sessões de Assembleia de Freguesia são substituídas pelo plenário de eleitores, não podendo haver deliberações válidas sem que estejam presentes, pelo menos, dez por cento dos cidadãos eleitores recenseados na freguesia.

O que fez e o que espera fazer por Feirão
Como Presidente da Junta procedeu à requalificação de todas as ruas da freguesia, empedrando-as com cubos, à excepção de duas ou três vielas. Nalgumas situações, as obras implicaram alguns cortes e realinhamentos. Requalificou a zona envolvente do cemitério novo.
Tem dado cumprimento a todas as competências da Junta, designadamente procedendo à limpeza dos caminhos vicinais.
Sente orgulho em ter recuperado a festa de Santa Luzia, que tem lugar no primeiro fim de semana de Agosto, sendo custeada pela Junta em vinte por cento. A mesma integra seis mordomos, divididos por Feirão, Lisboa e Marinha Grande, onde há uma grande comunidade de naturais e familiares da freguesia.
Organiza uma ceia de Natal, um magusto e um passeio anual, iniciativas abertas à comunidade local.
Quanto ao futuro, tem em mente um grande projecto para a freguesia, achando que ainda não chegou o momento adequado para a sua divulgação.

Respostas breves
1.Onde passou as últimas férias?
Gozei as últimas férias há dez anos na praia da Nazaré
2. Compra preferencialmente português?
Sim
3. Quais os seus passatempos?
Ver filmes
4. Qual o momento mais feliz da vida?
Nascimento dos meus sobrinhos
5. E o mais triste?
Falecimento de uma familiar
6. Que faz para ultrapassar as “neuras”?
Dificilmente tenho neuras
7. Qual o seu prato preferido?
Cozido à portuguesa; também gosto muito de uma boa feijoada
8. Qual a obra mais necessária para o futuro do concelho de Resende que falta fazer?
A ligação da vila de Resende a Bigorne
9. O que mais admira nos outros?
Gosto de me relacionar com pessoas sérias
10. O que mais detesta nos outros?
Inveja
11.Qual é a festa que lhe dá mais gozo comemorar?
A festa de Santa Luzia, a nossa padroeira
12. Quais os locais do concelho para onde costuma ir passear?
Gosto muito de ir até Caldas de Aregos, até ao cais junto ao rio; considero um local muito bonito
13. Tem algum objecto que guarda com particular predilecção?
Não
14. De que mais se orgulha?
Actualmente orgulho-me daquilo que faço na vida profissional; sinto-me realizado na angariação de clientes na área de seguros
15. Quais as três obras mais importantes para o concelho feitas após o 25 de Abril?
Ligação por estrada a todas as aldeias do concelho, a construção da escola secundária e a ponte da Ermida
16. Acredita que a construção da estrada Resende/Bigorne irá arrancar brevemente?
Gostava de acreditar, mas na actual conjuntura económica acho difícil
17. Que é que acha que o Eng. António Borges irá fazer após a saída da CM?
Irá ocupar um cargo político
18. Associa a palavra Resende a..?
Cerejas e cavacas
19. Já foi multado por infracção ao código da estrada?
Já, por ter sido apanhado a conduzir sem cinto
20. Concorda que o Estado limpe as matas de quem não o fizer e mande a conta?
Concordo
21. Que áreas deverão ser privilegiadas para criar emprego em Resende?
É difícil arranjar trabalho em Resende, mas acho que a área com mais hipóteses e futuro tem a ver com o turismo
22. Refira dois nomes que mais contribuíram para o desenvolvimento de Resende?
Dr. Brito de Matos
23. É favorável à redução do número de autarquias, designadamente de freguesias?
Sou favorável ao reordenamento das freguesias urbanas, rentabilizando os respectivos recursos. Já tenho muita dificuldade em defender a extinção das freguesias do interior, porque são garantia de proximidade e de defesa dos interesses das suas populações
24. Tem argumentos para convencer os mais novos a fixarem-se em Feirão?
Infelizmente não

*Apontamento da autoria de Marinho Borges, publicado no Jornal de Resende, número de Setembro de 2011

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Casa e Capela do Espírito Santo: um tesouro da época das Descobertas/Capela feita à romana*

Coordenadas GPS
N 41º 5’34.61´´
W 08º 0’32.53´´

A Casa do Espírito Santo é um dos solares mais interessantes e originais do concelho de Resende, com a sua capela (semi)circular, de óculo, a meio da frontaria, ladeado por inscrição (“Esta capela / mandou fazer / António Pereira / Pinto capitão que / foi de Amboíno. / Ano de 1676”) e brasão (armas dos Pachecos, Pereiras, Padilhas (?) e Pintos). A sua construção deve-se a António Pereira Pinto, natural de Vigião, em Freigil, capitão e governador da ilha de Amboíno, no Extremo Oriente, que defendeu, com bravura e sucesso, dos ataques e cercos regulares dos nativos islamizados, e consolidou a sua fortaleza, sob invocação de Nossa Senhora da Anunciada (1592/93).
Diz a tradição oral que ao regressar a Portugal, famoso e rico, mandou construir a Casa e a Capela do Espírito Santo, em Miomães, em cumprimento de uma promessa ou voto feito ao Divino Espírito Santo, quando se viu perdido numa tempestade no alto mar. À capela vinculou, em morgado, várias terras com a obrigação da celebração de duas missas semanais.
Várias tradições religiosas e culturais estão-lhe associadas. Antigos clamores e procissões de ladainhas por aqui passavam e, na ala virada ao rio Douro, da década de 30 à década de 70, do século passado, aí funcionou a escola primária feminina. Pelo seu valor cultural, este bem móvel privado, tal como outros de igual valor concelhio, deveria ser objeto de classificação como “Imóvel de Interesse Municipal”, de forma a salvaguardar o seu interesse histórico e arquitectónico.
Na rubrica “Olhares”, do Jornal de Notícias (edição de 2 de Setembro, pág. 42 e 43), uma iniciativa patrocinada pelo Casino da Figueira com o objetivo de alertar e inventariar o património português de elevado valor arquitectónico, em degradação, a Casa e a Capela do Espírito Santo foi objeto de uma extensa reportagem. O Jornal de Resende reproduz o ensaio efetuado pelo Arquiteto Luís Aguiar Branco, denominado “Capela feita à romana”, com a colaboração de Pedro Cardoso.

“O tempo dos Descobrimentos constitui uma revolução no Mundo, mas também no Homem, contribuindo para uma nova consciência sobre a diversidade paisagística e cultural dos territórios, que coexistem na forma circular do planeta e propiciam infindos caminhos do saber experimentado nas trocas e na miscigenação. O ciclo milionário das especiarias disponibiliza o usufruto de sucessivas gerações de portugueses aos grandes centros do Renascimento cultural europeu, com particular destaque e fascínio por uma Itália que redescobria os valores clássicos da arquitetura romana. A impressão dos tratados de arquitetura clássica difunde os ideais da razão, harmonia, proporção, composição e beleza, aproveitando a música, a matemática, a geometria e o desenho para sistematizar modelos de equilíbrio e perfeição, configurados em gravuras de fachadas, plantas, perspectivas e pormenores construtivos “ao romano”.
Uma descrição existente num dos volumes do “Nobiliário de Famílias de Portugal” de Felgueiras Gayo informa que “António Pereira Pinto, Capitão da Fortaleza de Amboíno no Estado da Índia, Instituidor do Morgado do Espírito Santo com capela feita à romana, que se vê junto do lugar de Miomães, concelho de Aregos, em que se veêm as Armas dos Pintos”, situação comprovada na inscrição exterior da capela existente na mesma freguesia, mas no concelho de Resende por motivo de ter sido extinto o concelho de Arêgos no séc. XIX. O ideal clássico “ao romano” irá ser transposto com uma adaptação vernacular neste solar, eliminando o ornato e procurando a pureza geométrica do retângulo (duplo-quadrado) que recebe, ao centro, a perfeição do volume saliente da capela circular e cobertura em meia-esfera, de evidente simbolismo celeste. Excetuando algumas alterações posteriores, tudo o resto está subordinado a uma ideia geral de regularidade e simetria, nas fiadas graníticas, na composição das fenestrações das fachadas, incluindo no espaço das pedras que ladeiam o óculo central (enquadrando o brasão familiar e parte da inscrição acima descrita), para além da cornija pouco saliente e de uma consciente eliminação da cruz na capela, substituída pela sineira e pela escultura de S. João Baptista que se encontrava, originalmente, no topo da cúpula. Esta simplicidade, quase humanista, é característica de uma época desornamentada do séc. XVI que se prolonga nos séculos seguintes, pelo que me parece plausível que a data (pouco visível) na inscrição corresponda ao ano de 1616. Colabora com esta datação temporal o facto de António Teixeira Pinto ser cunhado de Rui Teixeira de Macedo (fidalgo da Casa Real em 1579), e também por a ilha de Amboíno ter sido definitivamente perdida para os holandeses em 1615.
A geometria desornamentada deste valioso objeto arquitetónico deverá, certamente, ter contribuído para o desinteresse geral que o seu abandono ruinoso inspira, por manifesta incompreensão estética.”

Ornamento e arquitetura

O conjunto da casa e capela do Espírito Santo é um excelente exemplo de arquitetura desornamentada com valor patrimonial a preservar
Na introdução de um livro sobre Arquitetura, já não me lembro bem qual, li a anedota, ou história, como preferirem, de um fabricante de estruturas metálicas que vendia marquises em diversos estilos: colonial, gótico, clássico, moderno, etc. Após um temporal, o representante da fábrica deu-se ao trabalho de telefonar para alguns dos seus clientes, para saber se as marquises tinham resistido. Um deles, cuja marquise tinha sido levada pelo vento, respondeu-lhe: “O edifício resistiu bem, mas a arquitetura voou”.
O ornamento é uma parte essencial da arquitetura, ele surge, desde a Antiguidade, associado a uma ordem e a um cosmos primordial. Os gregos deram-se ao trabalho de o disciplinar e classificar, atribuindo-lhe, exatamente, a designação de “Ordem”. Em certas épocas e diferentes civilizações, contudo, por razões complexas, que incluem fatores históricos, culturais ou simbólicos, ele foi mais utilizado que noutras. O que não transforma a arquitetura desornamentada numa arquitetura de segunda, como o provam, por exemplo as formas geométricas puras das pirâmides do Egito ou o Museu de Serralves do arquiteto Siza Vieira.
Na história da arquitetura portuguesa também surgem, obviamente, períodos em que foi dada maior importância ao ornamento. No início do século XVI, por exemplo, o Manuelino deixou a marca de uma decoração pesada, tardo-gótica e, por vezes, já renascentista. A partir dos meados do século, contudo, surgem – e refiro-me apenas ao Norte do país – construções com uma grande sobrecarga ornamental, a par de outras em que a abstração geométrica “desornamentada” tem tendência a dominar. Seriam os artistas e encomendadores que estiveram associados a esse tipo de arquitetura, mais ignorantes do que os que mostraram a sua preferência por um tipo de construção mais decorado? Obviamente que não, até porque, frequentemente, os mesmos personagens estiveram associados aos dois casos.
O conjunto de casa e capela de que trata o artigo é um excelente exemplo de arquitetura desornamentada. Sei que ele, pelo seu carácter aparentemente menos espetacular, poderá, eventualmente, ser menos apreciado. Por essa razão é urgente chamar a atenção para construções como esta; é necessário ensinar as pessoas a apreciá-las, a estimá-las, a estudá-las e a conservá-las. No fundo, a sua aparente descrição até poderá ser uma qualidade; os maiores tesouros são, como todos sabemos, aqueles que não se deixam perceber à primeira...
João Ferrão Afonso, Escola das Artes, Universidade Católica do Porto / CRP
*Apontamento da autoria de Paulo Sequeira, publicado no Jornal de Resende, número de Setembro de 2011

domingo, 25 de setembro de 2011

Conferência do Dr. Adão Sequeira no cinquentenário do Seminário de Lamego

Excelência Reverendíssima Snr. D. Jacinto, bispo de Lamego

Rvmo Snr. Pe. Dr. Paulo Alves, Reitor do Seminário de Lamego.

Revmo. Snr.Pe. José Augusto, pároco de Resende

Senhores Convidados

Estimados Seminaristas

À casa da memória, eu venho, sem história, render a minha homenagem aos 50 anos do nosso seminário neste espaço físico da quinta da Rina ou quinta de S. Lázaro.

Aqui está, nesta casa, a cúpula nobre da nobre evolução do que foi o decreto do Concílio de Trento -(1545-1563)- ao criar um espaço de recolhimento onde o saber e a santidade evoluíssem em força uníssona e convergente para formar homens da palavra, da ação, da virtude, da solidariedade e especialmente verdadeiros pastores de almas.

Longe vai porém o séc XVI, o tempo inicial e difícil da capela e colégio de S. Nicolau, berço inicial dos seminários de Lamego e sua habitação durante muitos anos, até 1800.

Distante está também o 1º seminário, hoje messe de oficiais, na margem do rio Coura, onde durante 111 anos -(1800-1911)- aquele espaço se encheu de generosidade, doação, vida, projetos e saber, e donde também tantos valores humanos saíram para a igreja lamecense e para a sociedade em geral.

Sem recordação digna nos ficam os 10 anos difíceis, de 1911 - 1921, dos bens confiscados em que os jovens candidatos se acolheram a casas particulares e recebiam as aulas na habitação dos professores.

Com saudade de muitos vive-se ainda com memória a história do seminário na Casa do Poço -(1921-1961)-, mesmo frente à Sé, donde em cerca 40 anos tanto saber e santidade brotaram e tanta história se fez e memória por lá ficou. Aí nasceu a «Estrela Polar» em 1951, aí se orou, estudou, brincou e se fez acontecer muito do presente que hoje é passado, e que o Cónego Dr. Mendes de Castro em 2001 imortalizou nas 127 páginas do seu livro «Casa do Poço»

Fica para mim, em testemunho, o seminário atual, o seminário novo, o nosso seminário, o espaço e o tempo da minha entrada de boa memória e a saída por mim recordada como evento ao tempo não desejado.

Não tive em 1961 a honra de vir de Resende inaugurar, como novo aluno, este seminário; isso pertenceu ao curso meu anterior, mas em Setembro de 1962 aqui entrei, alegre, feliz, e esperançado em tornar-me um bom sacerdote para servir a Vinha.

Os planos do Senhor da Vinha eram outros e por isso aqui me preparou devidamente até aos últimos dias de 1968, enviando-me, já em 1969, para outros serviços da mesma Vinha onde Ele superintendia também no espaço destinado aos leigos já devidamente estruturado pelo Decreto do Vaticano II sobre o Apostolado dos Leigos que eu tinha também estudado minuciosamente.

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Ex.mos Senhores

Corria o ano de 1956 e no dia 1 de Abril, domingo da Ressurreição, na igreja de Santiago de Piães, como aliás em todas as igrejas da diocese, é lida a mensagem pastoral de Sua Excelência Reverendíssima D. João da Silva Campos Neves a anunciar a construção do Novo Seminário de Lamego.

A mensagem ia acompanhada de informação e instruções aos párocos para que todo o povo, do abastado ao mais humilde fosse parte dum projeto diocesano que iria depois ser viveiro e jardim donde flores humanas partiriam mais tarde, verdes e robustas, cheias de saber e virtude para levar ao povo a vida espiritual, a esperança divina e um sinal de Deus.

É a partir deste momento e com todo o direito que eu sempre disse e sempre ouvi dizer-« o nosso seminário».

Nosso, porque com esforço de todos nasceu e para o bem de todos exerceu e exerce a sua função.

E é exatamente em 1956 que nasce, de evento simples, a humildade e singeleza deste meu testemunho.

Vocês não imaginam, ninguém faz ideia, o que foi esse grito pastoral : «o nosso seminário».

O que se passou na minha terra, e só dela falo, foi encantador.

O meu pároco, o grande Pe. e Arcipreste Daniel da Costa, contaminou a freguesia e em toda ela, de Vilar a Torneiros ou de Ventuselas a Sanfins, em fins de semana sucessivos, se organizaram cortejos de oferendas, com alma, vida, folclore, e sobretudo bairrismo :- eram carros de lenha, toros de madeira, alqueires de milho, sacos de feijão, notas expostas em bandeiras, alegria, foguetes, cada povo com seu rancho, cada rancho com seu chefe , tudo amador, e a povoação, toda em peso, em manifesta gala de alegria e solidário apoio. E foi neste evento, dizia eu, que eu comecei a ser parte do nosso seminário: - na ornamentação dos carros, no ensaio dos cânticos que animaram o cortejo e na feitura de alguns versos a que se adaptaram músicas que todo o povo cantava e dançava a caminho do leilão no centro da freguesia e que ajudaram a que o lugar de Sanfins não ficasse atrás de nenhum outro.

É pois com direito que eu digo e nós dizemos e a diocese diz «o nosso seminário», seminário, de construção robusta e apresentação imponente, adequado às melhores exigência do seu tempo.

Em 1958, já em plena construção deste edifício eu entro no seminário de Resende com mais 54 jovens para em 5 de Setembro de 1962 e durante 5 dias, por especial deferência nesse ano, frequentarmos, em tempo de férias, um curso de cinema e fotografia dirigido pelo Snr.Dr. Mendes Leal, diretor da revista «Filme».

É logo nesse mês de Setembro, a pedido do Diretor da « Estrela Polar», o atual Pe. Dr. Joaquim Correia Duarte, que eu me sinto envolvido e deveras honrado ao escrever em «Primeiras Impressões» o meu primeiro artigo na Estrela Polar. Rico batismo. Aí falava eu aos alunos de Resende « aqui vos esperamos, ano a ano, na estrada da vida que nos levará aos nossos destinos, aos destinos de Deus ».

Eu recordo o testemunho da minha entrada em Lamego, lembrando a sã amizade existente entre nós, e também o carinho, a estima e o respeito que dedicávamos aos nossos mestres e superiores, homens de bondade, saber, cultura e santidade , sem discriminação de nenhum, embora cada um com o seu nível de capacidades em transmitir essa enorme riqueza de que eram portadores.

O seminário não é necessária e exclusivamente o espaço de formar os jovens que vão ser padres, mas sim a escola de formação de homens, donde saem também e geralmente aqueles que vão exercer o nobre e belo munus sacerdotal, e um bom sacerdote é sempre também parte de um homem humanamente bem formado nas lides do saber, da cultura, do conhecimento do mundo, da filosofia, da teologia, e especialmente das realidades humanas e espirituais.

Era o tempo da teologia, da exegese, da moral, da filosofia tradicional, do latim profundo, do grego suave e do hebraico leve, antecedidos de um conhecimento seguro das letras e das ciências.

Foi a época do ciclo missionário, das conferências Marianas, dos vicentinos e ainda da catequese nas escolas às quintas feiras.

Foram também os anos da nossa banda musical sob regência do Snr. Dr. Rui Botelho, onde surgiram qualificados executantes à custa dos longos ensaios na sala onde hoje funciona o nosso bar.

Foi, evidentemente, o tempo do Vaticano II, estudado, analisado, esmiuçado em profundidade à nossa maneira, na ânsia e busca segura de uma renovação.

O meu livro Vaticano II, em capa amarela, obra completa dos documentos conciliares, é ainda hoje uma fonte abundante de soluções, consulta e inspiração, quando sobre algum tema eu preciso de falar.

Foi nestes corredores e nas reuniões semanais das atividades extra escolares que alguns de nós escalpelizamos esses textos conciliares numa rara consciencialização de igreja e de futuro.

Recordo-me bem ter-se falado numa dessas reuniões, com preocupação e esperança, «a igreja só vai arrancar quando saírem bispos da geração conciliar. Eles aí estão, e a Igreja também, em renovada e constante intervenção e dinamismo, com o selo visível dessa etapa conciliar.

Curioso é ver, a 45 anos de distância, pelas notas apostas à margem nos textos, que os decretos sobre o Apostolado dos Leigos, Sacerdócio e Imprensa são os mais estudados e melhor analisados. Eram os nossos assuntos, o nosso campo direto de ação a muito curto prazo. Ao tempo, as preocupações de análise à vida e evolução política estavam afastadas, rádio só a ocultas, televisão não havia, jornais diários não chegavam cá e fumar um cigarro era muito arriscado.

Neste Seminário e nestes espaços, honra maior da nossa diocese, tudo está repleto de vida, doação, generosidade, e até «dúvidas salutares». Em cada esquina dos corredores, areia dos recreios, salas de aula ou silêncio da capela, há uma vida contada ou esperança desejada, que faz a memória que jamais se esquece e uma história que jamais será contada onde « as saudades» ficaram depois de nós, mas que existem, para louvor dos alunos, honra dos professores, dignidade da instituição e continuidade futura de um passado que não morre.

O presente está acima do passado, mas não pode esquecer os anos e os seus eventos, os séculos e a sua história, a vida e os seus atos, a juventude e os seus feitos.

As estrelas e as núvens do passado, pela voz da memória fazem chegar até hoje e guardarão para o futuro o legado sem tamanho do humanismo e humanidade desta habitação do saber, bom senso e até « jardim de preocupações».

Sempre assim foi e assim será, porque nós, como diz Anselmo Borges, somos titulares de uma vida que não morre com a nossa morte.»

Por isso, eu não vou falar dos campeonatos de futebol entre filosofia e teologia tão vivos e renhidos, das meias vermelhas e festa dos cónegos no domingo de Pentecostes, sob aquela vigilância cerrada e ineficaz dos superiores, das festas de fim de ano e das críticas à gestão e pedagogia dos nossos professores, da falta de meios de abertura ao mundo como a rádio, a televisão, jornais ou revistas, da falta de ligação à cidade e seu povo, até porque tudo se alterou logo em 1969.

Mas quero hoje ressaltar, relembrar e reviver:

-o saber dos nossos mestres e a sua dedicação ao ensino todo ele em regime de internato;

-a preocupação da equipa formadora, a sua dedicação aos alunos e atenção aos sinais;

-o rigor dos horários e o seu pontual cumprimento.

-o espaço de oração e a mística aí vivida;

-o tempo de estudo e a preparação rigorosa das matérias de exame;

-as reuniões semanais das equipas em que estávamos inseridos e os resultados obtidos;

-a lenta e segura evolução do jovem batina e chapéu preto para o jovem despojado, espontâneo, interventivo, com roupas de marca ou calças de ganga.

-a riqueza de manter escrita uma mensagem espiritual diária à porta da capela e a preocupação em viver o seu conteúdo;

-o aguentar um jornal mensal, pontualmente editado sob a responsabilidade do alunos, exclusivamente escrito por eles sob a vigilância atenta e controlo rigoroso dos superiores;

-a memória do 7 de Outubro e 7 de Janeiro com a preocupação amiga de ver se todos os amigos voltavam ou não;

-a recordação do 10 de Junho com a festa dos finalistas onde a glória, alegria e saudade saiam da alma, subiam ao rosto e apelavam a futuro;

-os concursos abertos onde se evidenciava a qualidade de quem a tinha e o espírito de aventura de quem a desejava ter.

A propósito de concursos internos, em honra do Snr. Cónego José Cardoso, de feliz memória, grande dinamizador da catequese na diocese, eu quero somente referir o concurso, por ele lançado, de quadras populares relativas à catequese, com distribuição de prémios em 3 Fevereiro de 1965.

Em 1º lugar ficou o nosso exímio poeta, cónego Esteves Alves com a poesia:

«-Catequese é Deus que fala

A dar a a luz que redime

Não há mestre mais seguro

Nem escola mais sublime».

Em 2º lugar um inesperado rabiscador de rimas que agora vos fala, com a poesia:

«-Se Cristo viesse agora

Nascer nesta diocese

Iria com os meninos

Aprender a Catequese.»

Estas poesias correram depois a diocese gravadas em azulejos de tom azul.

Snr. D. Jacinto, estimados amigos,

Recordar o passado é fazer história e fazer história é honrar o passado garantindo o futuro da memória e abrindo alicerces para a memória do futuro. Sobre este assunto e referente ao seminário antigo e novo seminário, a Estrela Polar de Agosto de 1961 escrevia assim : «uma porta que se abre, um passado que permanece pelos séculos e um futuro que se tornará presente dia a dia».

Esta linha de pensamento é uma espécie de sina que me segue e persegue desde sempre, não morreu ainda e certamente não vai morrer jamais, porque a morte leva os homens mas as ideias ficam através da identidade, da memória e da sua história.

E se não há porto seguro para barco sem rumo, também não há futuro certo para instituições que abdicam do passado ou menorizam os seus anteriores.

Nunca festejaríamos hoje os 50 anos do nosso seminário, como não teríamos festejado os 25, se há 50 anos os nossos anteriores não tivessem arquitetado o seu plano e suportado as dificuldades da sua construção.

Por isso sentimos orgulho e glória da glória difícil do passado e ligamos ao futuro a honra devida da sua existência. Nada de grande se faz e deixa sem o suor e risco, e será sempre o futuro a cantar o louvor à memória do passado e honrar os seus feitos.

Se alguém deseja memória e história sem escalar as encostas da dificuldade e o risco da ação e intervenção, está certamente no caminho certo do esquecimento inevitável.

Esta casa é uma casa de causas sempre novas e diferentes e nada do que aqui se vive se perde depois, mas vai como chuva miudinha ou fio de água invisível alimentar espaços de ação e ideias do bem , porque «o seminário é sempre a memória viva e eterna da igreja» «no mercado da alegria e negócio do bem fazer.»

O seminário perpetua-se no espaço e no tempo, nas pessoas e na vida, nos atos e reconhecimento, na ação e gratidão, nos fins que deu e forneceu, nos padres que foram seminaristas e nos seminaristas que ficaram leigos, uns e outros são glória e memória da sua existência.

O seminário, o nosso seminário perpetua-se pelo que foi, pelo que é, e pelo que será e por isso eu não posso esquecer uma das estrelas, talvez a mais alta e brilhante do nosso seminário - a «Estrela Polar», expoente grande de um passado difícil e nobre que ninguém vai poder ocultar, omitir ou menorizar, porque a sua Antologia, editada em 2007, jamais o vai permitir porque, ela está arquivada nas prateleiras de todas as grandes bibliotecas nacionais, exposta nas bibliotecas públicas e municipais de todo o norte do país, guardada em todos as Casas Episcopais, à disposição de todos os seminaristas nas bibliotecas de todos os seminários, visível em todas as escolas secundárias e juntas de freguesia da diocese, e também nas mesas de muitas centenas de Aselistas e cidadãos anónimos.

Esta obra, filha do seminário e dinamizada pela ASEL, é ainda caso único nos seminários de Portugal e também o expoente máximo e afirmação maior que «a melhor escola é aquela que educa para a gratidão» e reconhecimento.

Se o tempo vai já longo eu abro ainda espaço para dizer ao presente e ao futuro que o passado, em honra e glória da memória, se imortalizou também na nossa ASEL, vigorosamente nascida em 1984 que ainda hoje vive e viverá, e se honra de ao comemorarmos em Resende os nossos 25 anos com a presença e estímulo do Mons Luciano Guerra, ser a génese do 1º Congresso Nacional de Antigos Alunos dos Seminários de Portugal sob o título « Seminários - da Memória à Profecia» realizado em Fátima nos dias 24-25-26-de Abril de 2009 .

Estimados amigos, em todos estes passos humildemente eu estive metido e envolvido, ora entre palmas, hora entre grandes sarilhos.

Seminarista amigos, alguém disse um dia que «os povos morrem quando os senhores do templo nXXX-Assembleia-Aveiroão conseguirem alimentar a esperança», assim sendo recai sobre vós a guarda futura deste passado nobre e ficamos certos que, quando a memória faz história, a história ficará facilmente na nossa memória.

Seminário de Lamego, 17 de Setembro 2011

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