sexta-feira, 29 de abril de 2011

Grande entrevista de António Borges ao semanário "Douro Hoje" (Edição de 27-04-2011)*

O concelho de Resende continua a mudar. No terreno estão mais de 25 milhões de euros em obras, nas áreas da educação, modernização dos espaços urbanos, requalificação e melhoria da qualidade de vida em todas as freguesias.
António Borges, presidente da Câmara abraçou este desafio há quase três mandatos, e acredita que este concelho no interior do país continua a ser uma importante peça no puzzle na construção de uma cidadania onde há igualdade de oportunidades.
Como presidente da Associação de Municípios do Vale do Douro Sul acredita que uma das solução para os problemas para a crise é a conjugação de esforços e apela para que o país saiba escolher entre o progresso e a infra estruturação de Portugal, em vez de ficarmos parados à espera que a crise passe.


Douro Hoje- Como avalia este momento político e social que o país vive?
António Borges
- Em primeiro lugar, não há outra maneira de resolver os problemas: com trabalho. Caso não se entendam as coisas de outra forma no futuro pagaremos uma fatura muito alta. Se não tivermos sustentabilidade naquilo que fazemos e se esta não resultar do nosso próprio esforço tudo se perderá. O grande problema do futuro de Resende e da região Douro, é também achar que não devemos ter ambição. O que estamos a fazer em Resende é criarmos a tradição de estarmos na linha da frente dos desafios de uma sociedade contemporânea. Eu acho que, numa altura como esta, e num concelho como este, hipotecar o futuro é não termos feito aquilo que já criámos em Resende e, assim hipotecar o futuro das próximas gerações: é não termos a água, nem saneamento, ter as nossas estradas esburacadas, más acessibilidades, as mais altas taxas de abandono e insucesso escolar, e termos níveis de qualificação muito reduzidos, espaços urbanos decadentes e falta de tecido económico. Essa é a verdadeira questão.

DH- Portanto, a sua grande aposta são as pessoas…
AB
- A desertificação é uma questão que se coloca em Resende e à região e por isso temos de estabelecer todos os passos para que as nossas populações tenham as suas oportunidades. Não há nenhum concelho, região ou país que possa subsistir sem níveis de qualificação adequados, vocações territoriais e sem atividade económica. Em Resende, há por vezes, a ideia que temos uma abordagem muita politiqueira do desenvolvimento do país e em especial do interior, e tem-se passado a ideia que não precisamos de investimento. É óbvio que precisamos de investir, de qualificar as nossas populações e os nossos municípios e dar-lhe assim dinâmica territorial.

DH- Como caracteriza o trabalho desenvolvido ao longo destes anos no seu concelho?
AB
- Os passos que temos dado em Resende podem situar-se em 3 grandes domínios: a qualidade infra-estrutural do nosso território, a qualificação dos nossos recursos humanos (empresários e cidadãos em geral) de níveis de conhecimento e de desempenho essenciais para o desenvolvimento da região, e também o desempenho institucional. Não vou negar que na minha qualidade de presidente da Associação de municípios do Vale do Douro Sul noto a ideia de que cada um a trabalhar para o seu lado, dê frutos no imediato, mas depois tudo acaba por ficar aquém do que se consegue noutros domínios. Um presidente de Câmara tem obrigação de não baixar o nível. Tem obrigação como responsável político de encontrar caminhos, de os afirmar. Insultar não é a melhor forma de se estar na política.

DH - Como encontrou Resende ?
AB
- Partimos do zero. Naturalmente isso pode ter algumas vantagens, mas fizemos um caminho muito consistente. Nunca parámos e criámos uma marca e conseguimos modernizar o concelho. Só para dar a ideia que, neste momento temos em curso, com grande esforço adjudicados mais de 25 milhões de euros em obra, na área da qualificação urbana e da educação. Já está adjudicado o último centro escolar, a requalificação da escola secundária e preparatória (cerca de 12 milhões de euros), a conclusão do novo quartel da GNR, a ampliação do quartel dos bombeiros, o novo estádio municipal, o fórum municipal (recuperação do antigo mercado) que está já tem contrato assinado de adjudicação e a adjudicação da primeira fase do nosso parque urbano.

DH- Um autarca deve pautar pela diferença?
AB
- Enquanto presidente da câmara tenho a noção muito clara das nossas responsabilidades e acho que continuar a modernizar os nossos concelhos e a nós como autarcas. Há que perceber que em qualquer organização as lideranças fazem toda a diferença: eu não estou aqui para passar as responsabilidades para os outros ou criar ruídos, para depois me desculpar para aquilo que não sou capaz de fazer. Nunca passei culpas na câmara, apesar de algumas dificuldades. Temos de crescer a nível de desempenho institucional no douro sul. Aqui nada nos vem ter ao colo. Eu faço parte daquele conjunto de presidentes que têm de andar com os projetos ao colo, para que aconteçam. Recordo do enorme esforço que fizemos ao nível da água e saneamento, já que tínhamos uma das mais baixas taxas de cobertura da região, requalificámos a vila de S. Martinho de Mouros, as nossas escolas, criámos equipamentos desportivos de grande nível, estamos a valorizar a nossa base produtiva tradicional.

DH- A sua ideia é modernizar a vila e o concelho?
AB
- Hipotecar o futuro, como aconteceu até agora, é ter as mais altas taxas de abandono e insucesso escolar, ter as nossas vilas e cidades num estado deplorável e que repulsam aquilo que a é a própria atividade económica e a qualidade de vida das populações. Há que perceber que em Resende foram muitos anos praticamente paralisados. Naturalmente na região, e queria dar nota, que tenho esta declaração de interesses, como militante do partido socialista, no norte do distrito nós temos de ser capazes de ir mais além, e muitas vezes quando se fala em partidos e políticas, eu queria, apesar de tudo relevar, num momento como este, alguns investimentos importantes e estruturantes da região, que têm o selo e a marca do partido Socialista: o Museu do Douro, a Escola de Hotelaria de Lamego, o novo hospital de Lamego, o sistema de abastecimento do Balsemão, a requalificação da rede escolar que dará outro perfil ao cidadão. Portanto, quando muitas vezes, dizemos que isto é algo sem sentido, esquecemo-nos que por vezes, é por aqui o caminho. Muitas vezes, as pessoas só não querem os investimentos à sua porta, uma lógica de capelinha que está instalada nos concelhos e no país. Todos querem uma auto estrada à sua porta, mas ninguém quer uma acessibilidade capaz quando se trata do vizinho do lado. A nossa função é lutar pelas nossas populações e exigir aquilo que também temos direito: infra estruturas que introduzam nos nossos territórios níveis de competitividade.

DH - Estalou uma polémica com a capacidade de internamento do hospital a construir em Lamego. O que pensa disso?
AB
- Estamos a investir na saúde como nunca se investiu. Resende tem dois hospitais a ser construídos num raio de 50 quilómetros: Lamego e Amarante, como não acontecia há um século. Um hospital de nova geração em Lamego que representa um investimento de 50 milhões não deve ser posto em causa, e por isso não podemos ter a mesma abordagem da saúde como há 20 anos. A cirurgia de ambulatório é uma prática crescente. Por isso, percebo mal este tipo de abordagem ao novo hospital, por que em Lamego deveríamos marcar com uma enorme satisfação aquilo que está a ser feito. Naturalmente é mais fácil falar do que fazer, uns falaram sempre e nunca fizeram e outros fizeram concretamente. Se o problema é de camas, seria uma boa proposta para Lamego e para a região era consolidar o investimento que está a ser feito, não o politizar e não instrumentalizá-lo na lógica política e partidária, era transformar as instalações do antigo hospital numa unidade de cuidados continuados e assim conseguirmos mais camas. Esta seria uma forma útil e contributiva para desenvolver a região.
Eu já fui presidente de Câmara com um governo de direita e a minha preocupação sempre foi consensualizar. Nunca usei a Câmara de Resende para fazer política partidária e referi muito poucas vezes o nome do meu partido, ao longo destes anos, quando tenho de gerir os interesses do meu concelho. Recordo que tínhamos hospitais a cair, que eram espaços de grande degradação e desumanidade em relação às pessoas.
Quando finalmente estamos a fazer algo as pessoas vem para a rua com politiquice, pondo em causa aquilo que é uma nova forma e conceito e qualidade de serviço.

DH- A Scut’s ficaram em stand by, mas o que pensa do conceito de utilizador pagador?
AB
- O país está numa situação complicada e quando não há recursos para cumprir com determinados compromissos há que ajustarmo-nos às realidades.
Eu aceito a lógica do princípio do utilizador pagador e aceito que é algo de inultrapassável em função daquilo que é a situação económica que atravessamos.
Mas ao colocarmos as questões do pagamentos das scut’s na região, temos de ter a garantia que serão feitos determinados investimentos nas nossas acessibilidades, tais como o IC26, e resolver as acessibilidades a concelhos como Tabuaço, Pesqueira e Resende e Cinfães, que têm são das piores do país. Eu pessoalmente troco o pagamento das portagens pelos investimentos que faltam em termos de acessibilidades na região. E percebo que tenhamos de nos ajustar todos!

DH- Em Resende o que faz falta em termos de acessos rodoviários?
AB - Em Resende estamos a falar da ligação a Baião (Ponte da Ermida) que nos coloca nas portas da área metropolitana do Porto, (a menos de 40 minutos), a ligação de Resende a Bigorne pela A24.

DH- Mas com todos estes condicionalismos financeiros há investimentos em causa…
AB
- No município estabeleci um desagravamento fiscal de 4% para todos que têm domicílio fiscal em Resende, mas confesso que prevendo mais cortes, será algo muito difícil.
Não só manter os 4%, mas sim atingir os 5% que é o meu compromisso e a margem que a Câmara tem para desagravamento fiscal. Não vou querer falhar esse compromisso, mas vou ter de ajustar o próprio funcionamento da Câmara para aquilo que é a realidade do país.
Espero que seja concretizada a rede pública de banda larga em Resende, ainda este ano, que modificará a estrutura social e económica do concelho.
Baixar os braços e pensar que não temos de investir na qualificação dos nossos territórios, termos respostas ao nível de serviço público, pensar que podemos abandonar as populações mais débeis nesta região, não ter políticas capazes sociais capazes e naturalmente acharmos que o país tem de parar e se cairmos nesse erro isso será fatal em relação ao futuro.

DH – Numa conferência realizada pela Associação de Municípios já tinham abordado os problemas que as câmaras iriam enfrentar no futuro…
AB- Sim. Em 2007 as operações financeiras realizadas pelas autarquias tinham spred zero o 0,2%, e hoje em dia estes valores dispararam para 4 ou 5%, ou pura e simplesmente não são concedidos empréstimos.
Continuou a afirmar que o que nos dividirá no futuro passa por fazer uma forte estruturação em especial das zonas mais atrasadas e o que nos separará no futuro é a linha que separa hoje a direita da esquerda (a direita acha que temos de parar) eu pessoalmente acho que nós não podemos desistir de parte do país para que outra parte do país continue.

DH – Caldas de Aregos foi a cereja no topo do bolo..
AB
- Caldas de Aregos estava numa situação absolutamente insustentável, o balneário estava por acabar e fechado uma boa parte do ano, não havia animação. Por isso tomamos posição dominante naquilo que poderá ser o grande pilar de desenvolvimento do concelho e da região: o recurso termal de Caldas de Aregos. Estamos a construir aqui as bases para uma empregabilidade mais forte, e já fizemos alguns investimentos como a colocação de um multibanco, um posto de abastecimento de combustíveis e em breve, será restabelecida a travessia no Douro, numa parceria entre a Câmara de Resende e Baião e o IPTM.
Por força da operação que fizemos o município adquiriu duas empresas: a Companhia das Águas de Caldas de Aregos e a Sociedade de Hotéis de Caldas de Aregos que foram transformadas há um ano em empresas municipais. No futuro vamos fundir as empresas e lançar um concurso público internacional para que no capital social da nova empresa que resultará desta fusão possamos integrar os parceiros privados. Desta forma será possível promover a construção do novo hotel termal, um spa termal, a atualização do concelho termal e da componente turístico-imobiliária que está subjacente a todo o aproveitamento e que representará alojamento complementar. Esta era a parceira que se impunha.

DH- A cereja também é uma grande mais valia...
AB
- Não havia praticamente tradição de cereja, mas hoje somos o principal produtor do norte do país. Temos 24% da produção naci
onal e claramente a melhor cereja do país, e que primeiro entra no mercado em toda a Europa. É sem dúvida um contributo para a economia nacional e para a economia familiar. Este é o caminho que valoriza a base produtiva e por isso não podemos achar que o mundo rural é algo que não nos diz respeito.
Só conseguimos ter politicas assertivas e sérias se não deixarmos ninguém para trás, ao desenvolver apenas espaços urbanos e deixar importantes manchas de território. As políticas do município procuram uma lógica de rede e não vamos ninguém para trás. Nas freguesias onde as questões sociais são mais importantes estamos a criar redes sociais: lares de idosos em S. Romão e Felgueiras, mas temos freguesias com dinâmicas demográficas diferentes como Freigil e Anreade onde erguemos equipamentos desportivos, em S. João de Fontoura criamos uma relação forte com o Douro com parque fluvial de Porto rei, e requalificamos centros urbanos como S. Martinho, e em S. Cipriano vamos construir o centro escolar, cujo investimento será de 1 milhão de euros num auditório .

DH- A energia eólica é um importante vetor da economia do concelho
AB
- Parque eólico uma grande oportunidade. Afinal de conta não somo uma terra de ninguém. Contribuímos em muito para a agricultura e recordo que em termos de energia produzimos seis vezes mais daquilo que consumimos.
Se todos os concelhos fizessem isso provavelmente os nossos problemas de desequilíbrio da balança de transacções correntes, e nosso problema de défice externo provavelmente não tinha este contexto.

DH- Planos para o futuro
AB
- A minha vida como autarca nunca foi fácil e acredito que neste momento cabe a nós sermos mais criativos, generosos e ainda mais atentos. Em Resende não há navegação à vista. Temos um planeamento estratégico em cada mandato que contextualiza as nossas metas.
A educação, a empregabilidade e a qualificação são algo que nos mobiliza. Tudo isto não se fará num ano. Recordo que quando o país for chamado a decidir nas próximas eleições tem de ponderar entre desistir do país o, continuar o desafio da modernização e pela luta de um desenvolvimento equilibrado.
É muito importante para os políticos e presidentes de câmara nunca baixarem o nível da discussão política no seu concelho e nem deve recorrer, ou deixar envolver-se em discussões que desprestigiem o seu nível de representatividade.

DH- Portanto, Resende está na marcha dos grandes desafios...
AB
- O grande desafio é conseguir sustentabilidade económica e empregabilidade. Se a Câmara não introduzir uma atitude indutora do próprio desenvolvimento económico e empregabilidade do concelho, tudo demorará mais a acontecer.

*Entrevista conduzida por Iolanda Vilar, que se transcreve para este blogue com devida vénia.
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